segunda-feira, 1 de setembro de 2014

SÍNDROME DO X FRÁGIL - Doença esbarra no diagnóstico

Sabrina Muggiatti criou uma ONG para ajudar na divulgação da doença depois de descobrir que o filho Jorge era portadorCondição é frequentemente confundida com autismo, mas apresenta sintomas específicos que variam com a fase de desenvolvimento
Até os 8 anos de idade, Jorge era tratado pela mãe, a empresária Sabrina Pizzato Muggiatti, como uma criança portadora de autismo. Um diagnóstico novo, no entanto, revelou que o menino era, na verdade, portador da chamada Síndrome do X Frágil (SXF). Também chamada Síndrome de Martie & Bell, é uma doença genética e hereditária causada pela mutação de um gene no cromossomo X e uma das síndromes cromossômicas mais comuns.
Sabrina conta que comparava o desenvolvimento de Jorge com o da outra filha, mais velha, e via diferenças desde que o menino tinha 10 meses de idade. “Levamos ele a um neurologista e apenas sabíamos que ele tinha um atraso no aprendizado. Se tivéssemos mais informações sobre a doença, poderíamos tê-la identificado mais cedo”, lamenta Sabrina.
Eu digo X
Mãe cria ONG para divulgar síndrome que é pouco conhecida
A empresária Sabrina Muggiatti, com a ajuda da irmã, montou o projeto Eu Digo X, que se dispõe a divulgar a síndrome e dar apoio a familiares de portadores. A ONG ganhou a simpatia do cantor sertanejo Daniel, que ajuda na divulgação. “Como muitos brasileiros eu também não sabia da existência dessa síndrome que pode ser confundida com outras deficiências, quando na verdade é uma questão genética e uma deficiência especial. A aceitação e a procura por ajuda são muito importantes no processo de tratamento e inclusão dos portadores do X Frágil”, diz o cantor, que empresta sua imagem para campanhas de internet e tevê. Daniel, que tem um irmão com paralisia cerebral, também é embaixador das Apaes do Brasil.
Uma das principais lutas do projeto é pelo diagnóstico, que é confirmado por dois exames laboratoriais: o PCR para X-Frágil, que identifica a presença do gene em funcionamento no organismo, e o Southern Blot, que vê quem é afetado pela doença. O primeiro teste é considerado barato e simples; já o segundo é caro e feito em apenas dois lugares no Brasil. “Nos Estados Unidos, o diagnóstico é feito já no Teste do Pezinho, quando a criança nasce. Queremos que se faça uma lei para que aqui também seja feito assim, porque quanto mais cedo é o diagnóstico, melhor a criança responde ao tratamento”, diz Sabrina.
A ONG Eu Digo X também capta recursos junto a empresas e dá suporte a familiares com exames médicos e remédios, entre outras ações.
SAIBA MAIS
A Síndrome do X Frágil é confundida com o autismo, mas ela apresenta sintomas específicos em cada fase do desenvolvimento do portador. Conheça os sintomas principais:
- Deficiência Intelectual
- Dificuldade motora
- Orelhas, queixo e testa proeminentes
- Face alongada
- Palato alto
- Hiperextensabilidade de joelhos, mãos, punhos e dedos
- Convulsões
- Comportamento similar ao autismo
- Repete informações ao falar e se confunde facilmente
- Dificuldade de contato físico
Gene
A bióloga geneticista Ingrid Barbato, da Associação Catarinense do X Frágil, fundada em 2001 para estudar e mapear a incidência da síndrome no país, explica que a condição é causada pelo gene Fragile Mental Retardation 1 (FMR1), que produz uma proteína que atua no sistema nervoso em áreas como a coordenação motora, a habilidade para a matemática, a memória, o comportamental e a cognição. “Existem casos da doença em que a pessoa é pouco afetada intelectualmente, e os sintomas podem variar muito de caso para caso, mas em geral, as pessoas com o X Frágil apresentam orelhas, queixo e testa proeminentes e face alongada, além de uma elasticidade nos dedos das mãos”, detalha.
Outros sintomas incluem convulsões e comportamento similar ao do autismo, mas com algumas diferenças. “O portador faz contato visual e é mais falante, no que difere do autismo. Mas também é tímido e passa por momentos de irritação e tem problemas no aprendizado”, completa Sabrina. Depois de diagnosticado, Jorge, hoje com 10 anos, faz tratamentos fonoaudiológicos e psicomotores. Os medicamentos, por sua vez, o ajudam a lidar com a ansiedade, a insônia e o nervosismo.
Síndrome não se manifesta para todos
Não há dados sobre a incidência da Síndrome de Martie & Bell no Brasil. Estima-se que no mundo ela atinja uma em cada quatro mil mulheres e um em cada oito mil homens, tornando-a uma das mais recorrentes depois da Síndrome de Down, que afeta um em cada mil nascimentos.
Entretanto, a deficiência do gene pode ou não se manifestar, e no caso de portadores não-manifestos da síndrome, os chamados pré-mutados, a incidência pode ser ainda maior: uma em cada 280 mulheres carregam o gene e não sabem. No caso dos homens, um a cada 800 pode ser portador, de acordo com a geneticista Ingrid Barbato. “A doença pode se manifestar geração sim, geração não, mas não há uma regra para isso.”
A manifestação da doença se dá pela quantidade de repetições de CGG (citosina, guanina, guanina), uma sequência de bases nitrogenadas no DNA. “As pessoas normais têm até 54 repetições de CGG e então a sequência é interrompida por uma sequência AGG [com atimina no lugar da citosina]. Quem tiver mais do que isso, até 200 repetições, é pré-mutado. E em pessoas que têm mais do que isso, a síndrome se manifesta”, detalha Ingrid.
Mesmo assim, existem diagnósticos ligados à síndrome em sua forma pré-mutada. A Insuficiência Ovariana Primária associada à SXF (FXPOI) acomete 22% das mulheres que apresentam o gene pré-mutado e se caracteriza por uma redução da fertilidade, menopausa precoce, disfunção ovariana e irregularidade menstrual. Já nos homens, a Síndrome de Ataxia/tremor associada à SXF (FXTAS) pode ocorrer em até 40% dos portadores do gene. Trata-se de uma condição neurológica comumente confundida com Alzheimer ou mal de Parkinson, que tem como principais sintomas uma perda gradual da cognição e da memória, variação brusca de humor e problemas de equilíbrio, explica a geneticista.

FONTE:
YURI AL’HANATI
http://www.gazetadopovo.com.br/saude/conteudo.phtml?tl=1&id=1495457&tit=Doenca-esbarra-no-diagnostico


Garoto doma autismo a cavalo e inicia carreira inédita nos Três Tambores

João Aoqui, de 11 anos, é o primeiro autista a participar de competições no Brasil; garoto tem transtorno afetivo bipolar e síndromes de Tourette e Asperger

DIAGNÓSTICO -  EQUOTERAPIA - COMPETIÇÕES - MELHORAS - PRECONCEITOS

João Aoqui é o primeiro competidor com autismo a disputar a prova dos Três Tambores no Brasil. Mas antes de entrar para a história do esporte, o garoto de 11 anos teve de enfrentar barreiras desagradáveis de transtornos e sofrimentos - pessoal e familiar -, superado pelo trabalho, estudo e dedicação de uma equipe de equoterapia, que serão contados nas linhas a seguir.
Equoterapia: o melhor dos remédios para amenizar o sofrimento de João Aoqui
(Foto: Cleber Akamine)
DIAGNÓSTICO
O grito no amanhecer sinalizava o despertar de uma criança transtornada. Um autismo provocado pelas síndromes de Tourette e Asperger, mais um transtorno afetivo bipolar, causava reações físicas e principalmente psíquicas desesperadoras na família Aoqui. Ele tinha apenas cinco anos quando Adriana e Carlos Eduardo, mãe e pai de João, tiveram conhecimento sobre o distúrbio.
 Ele acordava pela manhã e gritava, chorava, dizia que nós não o amávamos e que fugiria de casa. Tivemos que esconder as chaves em alguns momentos. Tive que andar por duas horas com ele, "até o fim desta rua", por causa da sua inquietação. Passamos por situações desesperadoras - explicou a mãe que, desde então, passou a buscar soluções em diferentes clínicas e consultórios. E foram inúmeras respostas.
Um médico recomendou uma espécie de "prisão domiciliar" para evitar conflitos com outras pessoas. Outro chegou a indicar uma internação em hospital psiquiátrico, mesmo este sendo apenas para adultos. E todos receitavam remédios. À medida que eles eram aplicados, o organismo de João, ainda em desenvolvimento e em fase de crescimento, começava a responder negativamente. O fígado, órgão mais afetado, estava com os dias contados.
- Ele não tinha outra saída. Era preciso parar com a medicação pois o fígado estava sendo atacado - disse Adriana. Surgiu, então, a indicação da equoterapia.
EQUOTERAPIA
Quando chegou ao haras pela primeira vez, em novembro de 2013, João não tinha forças para subir no cavalo. As dificuldades, do caminhar à concentração, eram enormes e dificultavam as primeiras cavalgadas.
- Ele chegou muito debilitado, com dificuldades no andar, sem forças na perna - contou a treinadora Francine Baldo, competidora dos Três Tambores e equoterapeuta.
Francine Baldo, Adriana e Carlos Eduardo Aoqui acompanharam a aventura de 
João na arena do Parque do Peão de Barretos 
                      Após nove meses de treinos, João Aoqui cavalga sozinho nas arenas 
Aos poucos, aberto à nova experiência, João se familiarizou com o cavalo, com as pistas, com esporte. A ansiedade baixou, o comportamento melhorou e, em três meses de atividades, os resultados eram perceptíveis aos olhos de quem pouco entendia do assunto.
        - Ele estava ficando em cima do cavalo sozinho. Mais do que isso, ele mudou completamente a forma de se relacionar com as pessoas. O comportamento era outro - comentou a mãe.
Além de cavalgar, Francine Baldo explicou que João participa diretamente no trato do animal. Ele pega o cavalo na cocheira, escova, dá banho e até ajuda na alimentação.
- Esse contato é ótimo porque as pessoas com necessidades especiais costumam apresentar movimentos bruscos. Como o animal exige essa calma, movimentos mais suaves, eles acabam trabalhando essa noção de tempo e espaço. Isso melhora muito o comportamento - disse Francine, que citou outros benefícios como equilíbrio e fortalecimento muscular.
COMPETIÇÕES
Nesta sexta-feira, João entrou pela primeira vez na arena do Parque do Peão de Boiadeiro de Barretos, durante a 59ª edição do rodeio mais tradicional do Brasil. Embora não existam registros oficiais em outros países, João é considerado o primeiro autista a participar de uma competição oficial.
- Nós pesquisamos em diversos países e não encontramos resultados. O ingresso do João em competições é um sonho para mim. Quero criar uma categoria dentro dos Três Tambores para pessoas com necessidades especiais. Fico feliz com essa oportunidade dada a ele - comentou Francine Baldo, que já havia acompanhado uma apresentação do João no Rodeio de Americana.
MELHORAS
"A equoterapia nos devolveu uma vida". A frase resume a sensação de alívio e o sentimento de uma mãe desesperada, cansada de conviver com o sofrimento do filho. Ela jamais imaginara que um tratamento como este traria um resultado positivo num curto espaço de tempo.
- Ele sofre bastante porque tem um sensibilidade sensorial acima do normal. Ele tem dificuldades de interpretar um som, um cheiro, um gosto. Tudo é exagerado e isso causa um transtorno muito grande. Só que aos poucos ele foi melhorando. O principal sinal foi quando ele levou um tapa de uma outra criança no parquinho de um restaurante e veio até a nossa mesa, dizendo que apanhou. Em outra época, ele teria revidado. Isso é gratificante - lembrou Adriana.
PRECONCEITOS
João ficou três anos sem frequentar uma escola. Segundo a mãe, foram várias tentativas de colocá-lo em uma sala de aula - e inúmeras negativas.
- As escolas não estão preparadas para receber crianças com necessidades especiais e preferem pagar multas a receber uma. Falei com pelo menos cinco e nenhuma delas o aceitou. O tratamento ajudou nesse aspecto porque ele apresentou uma melhora de comportamento, facilitando esse convívio, a aprendizagem, o relacionamento - explicou Adriana, que não esconde o orgulho de vê-lo matriculado em uma escola.


João Aoqui treina duas vezes por semana em um haras de Santa Bárbara D'Oeste (Foto: Cleber Akamine)
FONTE:
Fotos
Por Cleber Akamine
Barretos, SP