segunda-feira, 30 de março de 2015
terça-feira, 24 de março de 2015
Lei 12.764/12 está só no papel, reclamam participantes de audiência sobre autismo
Especialistas reclamam da falta de tratamento
adequado para autistas
Uma em cada 88 crianças nascidas é autista
Centros de tratamento especializados, profissionais
capacitados e clínicas integradas com escolas foram algumas das reivindicações
dos que participaram da audiência pública, nesta segunda-feira (23), sobre as
políticas públicas para pessoas autistas. Promovida pela Comissão de Direitos
Humanos e Legislação Participativa (CDH), a audiência começou com um jovem autista
cantando o Hino Nacional em homenagem ao Dia Mundial do Autismo, celebrado em 2
de abril.
O principal problema apontado pelos participantes da
audiência foi que Lei Berenice Piana, como é conhecida a Lei da Política
Nacional de Proteção dos Direitos do Autista (Lei 12.764/2012), não é aplicada
na íntegra. Ela foi regulamentada pelo Decreto 8.368/2014, que colocou os
Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), do Sistema Único de Saúde, como os
responsáveis para o tratamento de autistas. Mas esses centros tratam de pessoas
com todos os tipos de transtornos mentais, incluindo os que enfrentam problemas
com o consumo abusivo de álcool ou drogas.
Para a enfermeira, mãe de autista e diretora do
Movimento Orgulho Autista Brasil (Moab), Tatiana Roque, e para Lívia Magalhães,
diretora jurídica do Moab, deveria haver centros especializados para tratamento
de pessoas autistas no Brasil. Elas explicaram que o autismo é uma síndrome que
apresenta vários espectros e varia de pessoa para pessoa.
— Precisa se cumprir a lei como ela foi escrita. O
autista precisa do centro especializado, uma clínica-escola, com equipe
multidisciplinar. O CAPs atende vários outros tipos de patologias e síndromes,
o que não seria específico para se tratar o autista. E hoje nós sabemos que o
CAPs não têm condições de atender. A fila de espera é enorme e autista não pode
esperar — disse Tatiana.
A enfermeira mostrou uma imagem de jovens autistas
amarrados em camas em uma clínica em Alagoas.
— A família não tem condições de oferecer um tratamento
adequado, o governo não ofereceu um tratamento para a família. Não tiveram o
diagnóstico precoce, não têm atendimento individualizado, não têm terapias. São
medicados diariamente e amarrados. Essa cena, pra mim, é frustrante, e me causa
raiva — lamentou ela.
A Representante da Diretoria de Saúde Mental da
Secretaria de Saúde do Distrito Federal, Simone Maria Guimarães, expôs o
trabalho desenvolvido pelo governo para melhorar o atendimento de pacientes
autistas. Mas Cibele Vieira, mãe de um autista, apontou uma série de problemas
como a limitada oferta de vagas para estudantes com autismo, a falta de
qualificação dos profissionais e a demora no atendimento na rede pública de
saúde.
— Eu me senti completamente ofendida como cidadã,
como mãe. Senti-me uma alienígena. Não tem dentro do poder público alguém que
ofereça tudo aquilo que foi dito aqui — desabafou.
Acompanhamento especializado
A diretora de Políticas de Educação Especial do
Ministério de Educação, Martinha Clarete Dutra, afirmou que a nova legislação
ajudar a fortalecer a inclusão das pessoas com Transtorno do Espectro Autista,
mas ponderou que a aplicação da mesma depende da União, dos estados e
municípios.
— Não podemos deixar que nenhuma matrícula seja
recusada, só que não basta ter matrícula, tem que ter atendimento de qualidade.
Hoje, o nosso grande desafio é esse pacto de atuarmos juntos, lá na ponta, para
que de fato todas as pessoas que estejam no sistema tenham atendimento e quem
não esteja, venha para o sistema — disse Martinha.
Mas o decreto que regulamentou a lei é omisso ao não
especificar a formação necessária para os profissionais contratados para
acompanhar os autistas nas escolas. A queixa foi apresentada pela diretora
jurídica do Moab.
— Hoje algumas escolas acabam contratando
estagiários, sem qualificação sem preparo para lidar com o autista, na sala de
aula. É muito importante que seja especificada a qualificação, seja professor
de ensino fundamental, com treinamento específico para lidar com o autista —
acrescentou Lívia.
Integração clínica-escola
Um modelo de espaço que reúne saúde e educação com
atenção qualificada para os autistas é uma a clínica-escola pública criada no
ano passado em Itaboraí, município da região metropolitana do Rio de Janeiro.
Fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, entre outros
profissionais compõem a equipe multidisciplinar do local, resultado da
persistência de Berenice Piana, que dá nome à Lei 12.764/2012.
— Na clínica-escola as mães são estimuladas. Elas
participam de grupos, recebem orientação, recebem capacitação da melhor forma
de cuidar dos seus filhos — assinalou Lívia ao elogiar a iniciativa da
Prefeitura de Itaboraí.
A médica psiquiatra da Clínica de Atendimento
Psicológico a Crianças Especiais (Cliama), Gianna Guiotti Testa acredita que o
modelo ideal é a integração clínica-escola-família.
— Não adianta a gente ter a clínica de referência se
ela não está integrada à escola. Gente, os professores precisam de ajuda! Eles
precisam de um grupo de apoio — afirmou a médica.
Diagnóstico Precoce
Outro grande problema para Tatiana Roque é a falta
de uma estatística oficial sobre o número de autistas no Brasil. Estima-se,
segundo ela, que haja 2 milhões de autistas no Brasil atualmente, número que
cresceu muito nas últimas décadas. Para Gianna, o aumento do número de casos de
autismo no país se deve também ao aumento da detecção da doença, que, há 20
anos era praticamente nula.
— O autismo é uma síndrome que a gente consegue
detectar até os 3 anos de idade. Se o diagnóstico é precoce, a assistência tem
que ser precoce. A gente pode intervir para que a criança tenha ganhos
importantes para o seu desenvolvimento — afirmou Gianna.
Acesso à medicação
Gianna alertou para a importância do acesso à
medicação. Ela explicou que não há medicação para autismo, mas há alguns
medicamentos que são importantes para alguns sintomas. A médica relatou ainda
que no último sábado uma mãe de um jovem autista ligou para ela dizendo que a
Secretaria só liberaria o medicamento para esquizofrenia.
— Isso também é muito importante: o acesso à
medicação — afirmou.
Horário especial
Tatiana Roque reclamou ainda do veto da presidente
Dilma a um artigo da Lei Berenice Piana que concedia horário especial sem
compensação para servidores públicos com filhos autistas. Ela explicou que os
pais de autistas são sobrecarregados devido à atenção e ao tratamento que devem
dar aos filhos.
— Tramita aqui no Senado um projeto de lei de
autoria do senador Romário, que prevê horário especial sem compensação para
servidor público com filho ou cônjuge com deficiência. E eu gostaria de pedir a
sensibilidade dos senadores para que essa proposta seja aprovada o quanto antes
porque ela vai ajudar muitas famílias que têm pessoas especiais — afirmou.
Reportagem:
Marilia Coêlho e Rodrigo Baptista
Foto:
Geraldo Magela/Agência Senado
Agência Senado (Reprodução autorizada
mediante citação da Agência Senado)
quarta-feira, 11 de março de 2015
Estresse entre mães de pessoas com autismo
Um estudo com 30 mães de pessoas com autismo
mostrou que 70% delas apresentavam altos níveis de estresse. As mães, que
tinham entre 30 e 56 anos de idade, quando consultadas sobre os comportamentos
dos filhos com os quais se julgavam mais eficazes para lidar, apontaram os
movimentos estereotipados dos filhos, o grande tempo gasto em uma atividade
particular e a insistência para que as coisas sejam feitas de uma determinada
maneira. “O estresse psicológico constitui-se em um processo no qual o
indivíduo percebe e reage a situações consideradas por ele como desafiadoras,
que excedem seus limites e ameaçam o seu bem-estar”, descrevem os pesquisadores
Carlo Schmidt e Cleonice Bosa, autores do estudo “Estresse e autoeficácia em
mães de pessoas com autismo”.
A autoeficácia é descrita no estudo como o
julgamento do sujeito sobre sua habilidade para desempenhar com sucesso um
padrão específico de comportamento. “A natureza crônica do autismo tende a
acarretar dificuldades importantes no que tange à realização de tarefas comuns,
próprias da fase de desenvolvimento dessas pessoas”, explicam os autores.
Carlo Schmidt e Cleonice Bosa ressaltam ainda que a
compreensão da relação entre autismo e estresse familiar não pode ser baseada
em relações lineares entre possíveis causas e efeitos. As explicações sobre
como esses dois fatores estão relacionados, defendem os pesquisadores, devem
levar em conta diversos outros fatores envolvidos no processo de adaptação da
família a uma condição crônica, como o autismo.
Texto escrito por Silvana Schultze, do blog
http://www.meunomenai.com
Para conhecer o estudo completo, acesse o link:
http://seer.psicologia.ufrj.br/index.php/abp/article/view/88/101
terça-feira, 3 de março de 2015
Benefício da Assistência Social para pessoas com deficiência - BPC LOAS e Bolsa Família
Atenção!
O Benefício do Bolsa Família para você e o Benefício LOAS para seu filho com deficiência são compatíveis.
Se você tem
renda familiar inferior a 1/4 do salário mínimo e desejar o Bolsa Família, pode
se cadastrar no CADÚNICO e requerer o Bolsa família em um CRAS (Centro de
Referencia da Assistência Social) perto de sua casa. Não precisa levar seu
filho com deficiência para fazer este cadastro.
Como a renda
do Bolsa família não interfere no BPC LOAS, você pode requerer o BPC LOAS pro
seu filho com deficiência na Agência do INSS
Atenção !
Para solicitar o Benefício Assistencial - BPC/LOAS você tem que agendar o seu
atendimento em uma Agência do INSS.
Esse serviço também está disponível na Central de
Atendimento, pelo telefone 135, de segunda à sábado, das 07:00 às 22:00,
horário de Brasília.
Na
impossibilidade de comparecimento no dia e horário, você deve remarcar o seu
atendimento por meio da Central de Atendimento 135.
É importante esclarecer que a remarcação pode ser
realizada uma única vez e que deve ocorrer antes do horário agendado, pois do
contrário será agendado um novo atendimento. Em caso de antecipação da data do
atendimento, será mantida a Data de Entrada do Requerimento - DER. Já no caso
de prorrogação, a Data de Entrada do Requerimento será a nova data agendada.
Esses são os documentos que deverão ser apresentados
no dia do seu atendimento.
Fique
Atento!
O Benefício Assistencial ao Idoso - BPC/LOAS
corresponde à garantia de um salário mínimo, na forma de benefício assistencial
de prestação continuada mensal, devido à pessoa idosa com 65 anos ou mais, que
comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e também não possa
ser provida por sua família.
Tem direito o brasileiro nato ou naturalizado,
idoso, residente e domiciliado no Brasil, que não receba qualquer outro
benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime, inclusive o
seguro-desemprego, salvo o de assistência médica e a pensão especial de
natureza indenizatória.
Também tem direito o indígena idoso, que não receba
qualquer outro benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime,
salvo o da assistência médica.
Somente possuem direito ao benefício aqueles cuja
renda familiar ou grupo familiar mensal per capita seja inferior a ¼ do salário
mínimo.
O Benefício
Assistencial ao Idoso - BPC/LOAS não pode ser acumulado com:
qualquer Benefício Previdenciário, exceto com
pensões especiais mensais devidas às vítimas da Hemodiálise de Caruaru,
hanseníase, talidomida, Pensão Indenizatória a Cargo da União, Benefício
Indenizatório a cargo da União;
Pensão Mensal Vitalícia de Seringueiro;
Benefício de qualquer outro regime previdenciário;
Seguro-Desemprego.
Observações:
a) o Benefício Assistencial ao Idoso - BPC/LOAS já
concedido a um membro da família (mesmo aqueles concedidos antes da Lei 10.741
Estatuto do Idoso) não será levado em consideração no cálculo da renda familiar
per capita em caso de solicitação de um novo benefício de Amparo Assistencial
ao Idoso por outro membro da família.
b) a condição de acolhimento em instituições de
longa permanência, assim entendido como hospital, abrigo ou instituição
congênere não prejudica o direito do idoso ao recebimento do BPC/LOAS.
c) o beneficiário recluso, devidamente comprovado,
não fará jus ao Benefício de Prestação Continuada da Assistência
Social-BPC/LOAS, uma vez que a sua manutenção está sendo provida pelo Estado.
d) O beneficio assistencial é intransferível e,
portanto não gera pensão aos dependentes, além de não receber o abono anual (13º
salário) e não estar sujeito a descontos de qualquer natureza.
Para efetuar
o requerimento, pode ser nomeado um procurador. Consulte também informações
sobre representação legal.
O atendimento da Previdência Social é simples,
gratuito e dispensa intermediários.
Se você deseja requerer o BPC LOAS . Esta renda não
é considerada para requerer o BPC LOAS no INSS.
Para solicitar o Benefício Assistencial ao Idoso -
BPC/LOAS você tem que agendar o seu atendimento. Esse serviço também está
disponível na Central de Atendimento, pelo telefone 135, de segunda à sábado,
das 07:00 às 22:00, horário de Brasília.
Na
impossibilidade de comparecimento no dia e horário, você deve remarcar o seu
atendimento por meio da Central de Atendimento 135.
É importante esclarecer que a remarcação pode ser
realizada uma única vez e que deve ocorrer antes do horário agendado, pois do
contrário será agendado um novo atendimento. Em caso de antecipação da data do
atendimento, será mantida a Data de Entrada do Requerimento - DER. Já no caso
de prorrogação, a Data de Entrada do Requerimento será a nova data agendada.
Esses são os documentos que deverão ser apresentados
no dia do seu atendimento.
Fique
Atento!
O Benefício Assistencial ao Idoso - BPC/LOAS
corresponde à garantia de um salário mínimo, na forma de benefício assistencial
de prestação continuada mensal, devido à pessoa idosa com 65 anos ou mais, que
comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e também não possa
ser provida por sua família.
Tem direito o brasileiro nato ou naturalizado,
idoso, residente e domiciliado no Brasil, que não receba qualquer outro
benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime, inclusive o
seguro-desemprego, salvo o de assistência médica e a pensão especial de
natureza indenizatória.
Também tem direito o indígena idoso, que não receba
qualquer outro benefício no âmbito da seguridade social ou de outro regime,
salvo o da assistência médica.
Somente possuem direito ao benefício aqueles cuja
renda familiar ou grupo familiar mensal per capita seja inferior a ¼ do salário
mínimo.
O Benefício Assistencial ao Idoso - BPC/LOAS não
pode ser acumulado com:
qualquer Benefício Previdenciário, exceto com pensões especiais
mensais devidas às vítimas da Hemodiálise de Caruaru, hanseníase, talidomida,
Pensão Indenizatória a Cargo da União, Benefício Indenizatório a cargo da
União; Pensão Mensal Vitalícia de Seringueiro; Benefício de qualquer outro
regime previdenciário; Seguro-Desemprego.
Observações:
a) o Benefício Assistencial ao Idoso - BPC/LOAS já
concedido a um membro da família (mesmo aqueles concedidos antes da Lei 10.741
Estatuto do Idoso) não será levado em consideração no cálculo da renda familiar
per capita em caso de solicitação de um novo benefício de Amparo Assistencial ao
Idoso por outro membro da família.
b) a condição de acolhimento em instituições de
longa permanência, assim entendido como hospital, abrigo ou instituição
congênere não prejudica o direito do idoso ao recebimento do BPC/LOAS.
c) o beneficiário recluso, devidamente comprovado,
não fará jus ao Benefício de Prestação Continuada da Assistência
Social-BPC/LOAS, uma vez que a sua manutenção está sendo provida pelo Estado.
d) O beneficio assistencial é intransferível e,
portanto não gera pensão aos dependentes, além de não receber o abono anual
(13º salário) e não estar sujeito a descontos de qualquer natureza.
Para efetuar
o requerimento, pode ser nomeado um procurador. Consulte também informações
sobre representação legal.
O atendimento da Previdência Social é simples,
gratuito e dispensa intermediários.
ATENÇÃO !
A renda do BPC LOAS já recebido por alguém da
família conta como renda familiar por pessoa e aí pode fugir do critério de
renda para acessar o Bolsa família, por tanto, primeiro requeira o Bolsa Família no CRAS e depois o BPC LOAS no
INSS (quando for o caso).
domingo, 1 de março de 2015
Ética e Clínica no Autismo Infantil
“A queda dos ideais fez com que cada vez mais os
resultados científicos passassem a ser usados como argumento de autoridade.
Contudo, nem tudo pode ser mensurável, nem tudo pode ser convertido em
evidência.”
Marcelo Veras
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Após o nascimento o sistema neurológico do bebê
ainda está em formação. A percepção e
reação aos estímulos externos ocorrem sem que tenha consciência de si próprio,
ou seja, ainda não se reconhece como o sujeito de suas ações e sensações. No
entanto, antes de nascer o filho já apresenta uma existência, quando é nomeado
no desejo dos pais, ocupando um lugar no discurso familiar.
O nascimento em si é uma crise primordial que se
apresenta ao psiquismo, onde se instala a marca de uma relação biológica
interrompida.
A placenta como uma parte
de si que perde ao nascer, assim como o seio materno em sua função de corte,
simbolizam o objeto perdido, instauram um vazio, um buraco a ser preenchido de
um objeto jamais reencontrado e sempre substituído. Jacques Lacan fala de um
reencontro com o signo de uma repetição impossível, como a busca incessante no
Outro do que falta em nós mesmos.
De acordo com Sigmund Freud, ocorre uma perda da
libido que induz o sujeito a buscar fora de si mesmo uma completude. Podemos
pensar no mal estar da civilização quando diz que o prazer que se busca nunca
será completo, pois sempre faltará algo. Isto nos remete ao nosso mundo
contemporâneo com a ilusão do corpo/imagem perfeita ou da tal “felicidade”,
ofertada pelo mercado, mas nunca alcançada.
A metáfora do espelho é vital na constituição do
sujeito, num circuito pulsional onde a imagem do corpo vai sendo construída nas
trocas corporais, gestos e na voz que o adulto vai recobrindo de sentido. O
desamparo de um recém-nascido para além do orgânico é fundamentalmente um
desamparo simbólico, quando começa a habitar marcas, traços e caminhos
oferecidos pelo adulto em busca de satisfação e reconhecimento. Assim vai se
introduzindo no mundo, constituindo sua subjetividade inicialmente através do
Outro primordial materno e, posteriormente,
na interdição paterna com sua entrada no campo simbólico e na linguagem.
Ocorre que no autismo infantil este processo de
constituição do psiquismo, nos primeiros anos de vida, se encontra bloqueado
numa blindagem que não torna possível a conexão e relação com o desejo do
Outro, defendendo-se da linguagem e do mundo.
É como se não houvesse objeto perdido, encontra-se restrito ao organismo
biológico, com seu corpo constituído apenas como uma superfície refratária a
trocas, sem percepção de si e impossibilitado de constituir um corpo pulsional.
Além do corpo físico há uma corporeidade pulsional,
um circuito de força que possibilita a construção da imagem corporal que a
criança autista não consegue alcançar. Há uma força que não se deixa apreender
entre o corpo e o psiquismo e que precisa representar-se encontrando uma
expressão simbólica, caso contrário vai se repetir, sem espaços perdidos ou
bordas a serem inscritas.
Há uma recusa do Outro, que é sentido como invasivo
e ameaçador. Recusa do olhar, do alimento, do corpo e principalmente da voz
como uma trava em todos os circuitos pulsionais, numa defesa incessante. Seus
atos sem sentido diminuem sua agitação e angústia. Em sua relação com os
objetos não aparece o brincar, mas um manejo de encher e esvaziar que se repete
de forma compulsiva. O mutismo não se relaciona a uma incapacidade fisiológica ou a um
déficit, mas a uma impossibilidade de enunciação. A criança apresenta-se como
objeto de cuidados, fracassando em sua enunciação e não surgindo como sujeito
do inconsciente.
A causa é desconhecida e o aumento de sua
incidência na atualidade talvez possa relacionar-se às mudanças na
subjetividade contemporânea. Os aspectos neurológicos apontados pela
neurociência permanecem apenas como uma possibilidade não demonstrada, a
indústria farmacêutica aparece como solução imediata e as políticas públicas
reabilitadoras como única intervenção, restringindo a abordagem
interdisciplinar.
Com o DSM-5 (2013), o espectro autista se
transforma em um transtorno do neuro-desenvolvimento, que prioriza a adaptação
cognitiva em detrimento da complexidade psíquica e apaga o sujeito a ser
trabalhado subjetivamente, visando à adequação do comportamento. O efeito é a
patologização e a medicalização crescente da infância e tratamentos adaptativos
que apontam déficits, com uma abordagem externa à criança, onde suas produções
subjetivas e singularidade não teriam espaço para mostrar-se e desenvolver-se.
Penso que o tratamento com crianças autistas deva
partir mesmo destas produções enigmáticas, sem sentido, repetitivas, e a partir
daí oferecer um espaço e tempo possíveis para que se dê a possibilidade de uma
construção psíquica infantil, que por alguma razão não se constituiu.
É uma aposta ética na possibilidade do surgimento
do sujeito, em uma prática clínica que dê condições à criança de poder
encontrar saídas para este estado e gerir sua vida, com sua forma particular de
inserção e relação no mundo. Há um sujeito a ser escutado e reconhecido em seu
modo singular de funcionamento, alguém a ser trabalhado psiquicamente.
J. C. Maleval cita em Étonnantes mystifications de
la psychothérapie autoritaire: “(...) Se insistem nas coisas que vocês
consideram normais, encontrarão frustração, decepção, ressentimento, inclusive
raiva e ódio. Se se aproximam respeitosamente, sem preconceitos e abertos a
aprender coisas novas, encontrarão um mundo que jamais imaginaram”.
Ana Lucia
Esteves
Psicóloga/Psicanalista
São Paulo,
São Paulo, Brasil
Pós-Graduação/Especialização
pela Universidade de Nac. de Córdoba - Argentina.
Formação
continuada pelo Clin-A (Centro Lacaniano de Investigação da Ansiedade), com
participação em Seminário clínico.
Elaboração
do projeto: "Saúde Mental do trabalhador com deficiência mental".
Psicóloga Clínica do Centro de Desenvolvimento Humano - CDH/AME .
analuesteves@hotmail.com
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