quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Retrospectivas Atuais do Autismo

Em 1985, li o livro: Década de 80 – Autismo – Uma atualização para os que atuam na área: do especialista aos pais, escrito pelo especialista em psiquiatria infantil e do adolescente Ernest Christian Gauderer.

Se bem me lembro, na época foi o primeiro livro sobre o tema, escrito por um brasileiro.

Eu já reclamava muito da falta desse tipo de literatura, pois no Brasil tinha só uma meia dúzia de autores estrangeiros traduzidos e como já tínhamos uns seis anos na batalha contra a então definição resumida do Autismo, pela Society for Autistic Children dos EUA em 1978, três anos depois do nascimento do meu filho quando ele fora diagnosticado autista por uma corajosa psicóloga, devidamente confirmado pela psiquiatria.

O livro foi de grande valia, pois pouco ou quase nada existia a respeito do autismo, com exceção das publicações estrangeiras

Em 1993, novamente o doutor Gauderer, publicou mais um livro: Autismo e Outros Atrasos do Desenvolvimento, no qual reuniu artigos de especialistas com o objetivo de informar sobre esse distúrbio no desenvolvimento, atualizando profissionais de saúde e educação, proporcionando um tratamento mais eficaz e atual a crianças, adolescentes e adultos autistas. Tanto o especialista quanto o leigo que desejassem se informar sobre o assunto puderam se beneficiar com esse trabalho.

Não combinamos nada, mas neste mesmo ano eu publiquei o meu livro, Vida de Autista – Uma saga real e vitoriosa contra o desconhecido, mesmo porque o doutor Gauderer era um psiquiatra especialista em autismo, e eu, apenas pai de autista que obtivera vitórias altamente significativas contra a síndrome.

“Quanto maior a nossa ignorância profissional, maior será a nossa prepotência, onipotência e certeza de cura. Esta postura permitirá furtarmo-nos de sensações de insegurança, medo e ansiedade, frente àquilo que não sabemos. Tornamo-nos radicais e senhores da verdade.” Escreveu o doutor Garderer.

Já eu, que ainda não tinha lido o livro dele, escrevi no Vida de Autista: “Não há nada mais trágico no mundo que uma pessoa manter pensamentos de limitação sobre outro ser humano. Um pensamento de imperfeição, projetado sobre uma pessoa sensível, restringe algumas vezes essa pessoa. Durante muito tempo esses resultados são calamitosos. Aprendemos a dar a cada pessoa que nos cerca, em qualquer ocasião, sua completa liberdade mental.”

Dia desses estava conversando com uma amiga, mãe de autista. Entre veio de antes e vai de agora, eu dizia para ela que, devíamos cobrir nossas mágoas e rejeições sofridas com camadas e camadas de amor, tipo a pérola, já que há pouco tempo atrás nossos autistas, além de encapsulados, até comparados com ostra foram. Poucos se lembram disso e muitos preferem esquecer-se da comparação até por desconhecer a grandeza da analogia.

Com rezas, benzimentos, raiva, liminentos, doses homeopáticas, alopáticas, florais e chazinhos, broncas, dúvidas, discussões, tratos e contratos com “átras, istas, ólogos, eutas, e etc, etc... Suportamos as dores... Cansamos... Mas não desistimos.

Entendemos que ser autista, significa um verdadeiro recomeço para que o estágio terreno seja um tempo de paz e alegria no coração de quem o tem.

Vida de Autista ainda é um jovem livro, adolescente que além de edições contínuas, resiste catalogado nas livrarias. Foi premiado pelo Movimento Orgulho Autista Brasil, como livro destaque, o que enche de orgulho este pai/autor, sua família e o próprio personagem principal, que no seu singelo discernimento autístico demonstra o sentimento da emoção ao saber do ocorrido, embora a resistência de alguns setores profissionais continuem teimando pela limitação sentimental mental do seu semelhante, autista ou não.

A atualidade do livro Vida de Autista é tão impressionante quanto os livros do doutor Gauderer.

Nada mudou no front, como diz minha amiga, ou nada se deseja que mude no front.

Nessas ocasiões costumamos repetir que continuaremos iguais ao passarinho, de gota em gota tentando apagar o incêndio da floresta fazendo a nossa parte.

Ficando feliz com todos aqueles que fizeram e fazem parte do nosso universo autista, e quem mais chegar, saboreando nos lábios mais uma lágrima doce.

Autismo Quebrando Preconceitos

Com iniciativas destinadas a pessoas com autismo, cuidadores, das áreas profissionais, técnicas e afins, estudantes, instituições de ensino e universidades, foram promovidas inúmeras ações para celebrar o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, instituído pela ONU em dezembro de 2007.

Na Europa, embora recém-nascido, o Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, teve intensa mobilização, como por exemplo, em Portugal, França e Alemanha, Suécia e Inglaterra, onde federações e associações afins promoveram encontros para os interessados, inclusive patrocinados por iniciativas oficiais e privadas interessadas na área.

É preciso destacar que a voz de milhões de incompreendidos autistas foram ouvidas nesse dia histórico que culminou com a mensagem universal proferida pelo Papa, instando todas as comunidades religiosas e ativistas, a fazer mais pelo autismo em todo o mundo, mesmo que a crise global se aprofunde, e que o Vaticano forneça orientações sobre o modo como as igrejas devem se relacionar com as crianças e adultos deficientes.

E mais...

O presidente dos EUA, em carta divulgada pela Casa Branca, determinou o desenvolvimento de um plano no âmbito da saúde, com o objetivo de garantir a acessibilidade de pessoas com deficiência, oportunidade de emprego, luta contra a discriminação, inclusão de alunos com necessidades educativas especiais, dedicando um capítulo específico para atenção de pessoas com autismo.

Enquanto isso no Brasil...

O presidente da República não pronunciou sequer uma palavra em favor do Dia Mundial da Conscientização sobre o Autismo e no Dia Internacional do Deficiente para que principalmente organismos governamentais pudessem se conscientizar, comprometer-se e fazer com que programas de ação conseguissem modificar as circunstâncias de vida dos portadores de necessidades especiais no Brasil, como está acontecendo em todo o mundo.

É compreensível, pois se perguntado sobre tema provavelmente responderá que nada sabia.

O Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo ainda não entrou para calendário oficial.

O ministro continua preocupado com a agenda abortista do Ministério da Saúde, até patrocinando documentário com depoimentos favoráveis à legalização do aborto e mais preocupado ainda, em manter a portaria que impede o repasse de verbas para consolidação dos serviços necessários para o atendimento dos deficientes, autistas ou não.

Numa abordagem dinâmica, manifestações populares celebraram e atraíram a atenção das autoridades para promoverem ações de cuidados à tragédia da síndrome, com fatos de real grandeza como o ensejado pelo Movimento Orgulho Autista Brasil, premiando empreendedores e abnegados no sentido de sensibilizar parlamentares e autoridades governamentais, no encaminhamento de leis e projetos que possam viabilizar melhores condições de vida para o autista.

Embora hoje já possamos agradecer um pouco do que já foi conseguido de leis, decretos e benefícios já em favor do autista, pelo esforço de deputados, senadores e abnegados, embora com inexplicável resistência de parlamentares e até de governador para o seu cumprimento, o autismo inspira e entusiasma, pois motiva para com eles aprender.

Nenhuma forma de quebrar preconceitos é melhor do que tentar entender o autismo, conhecendo autistas e aqueles que os cuidam.

Isso já está acontecendo, mesmo que embrionariamente.

É necessário desfazer a imagem de que o autista ensimesmado é uma tese, pois uma tese só se defende quando se revela sua existência, defendendo seu ritmo, que muitos imaginam não ser possível.

Os avanços na discussão sobre o autismo dependem de pequenas ações particulares.

Podemos repetir a manchete de um jornal que disse: “Só ONGs se lembram dos autistas.”

Ainda que tardiamente, nossos governantes também podem lembrar.

Ainda há tempo e não dói

Retomada - Cotidiano da Esperança

    Só para lembrar, ou não esquecer, estou retornando a esta minha tarefa, depois de tantas surpresas que a vida nos oferece todos os dias, algumas agradáveis e outras não, que aceitas, me forçaram alongar a volta dos meus amadores escritos aqui, embora desejando escrever todos os dias.

    Sabemos que nem tudo o que nos acontece na vida é definitivo, não importa a dimensão em que estejamos principalmente se estivermos ofertando sentimentos de compreensão para ela, como amoroso exercício do nosso coração.
    Educar, por exemplo, é um exercício que traz compensação benéfica imediata para aquele que ensina e muito mais para aquele que aprende.
    O resultado desse trabalho surge justamente naqueles que estão abertos ao conhecimento por se descobrirem úteis.
    Como seres em constante evolução, ninguém tem obrigação de saber o que se passa na minha cabeça, ou o quanto já estudei para chegar ao nível de conhecimento em que estou.
    O surpreendente mesmo é descobrir a toda hora o “só sei que nada sei”, aprendendo junto para depois da somatória, fazer a divisão para se chegar a um denominador comum, pois o tempo cruel já me fez compreender que não devo adiar compromissos.
    Há muito tempo já estávamos com a cultura cristalizada de que o ano só começava depois do carnaval, isto é: lá pelos idos de março, segundo os romanos.
    Como o Brasil é também o país do imponderável, as leis canônicas fizeram com que ele acontecesse nos primeiros dias de fevereiro, surpreendendo a todos, mas, proporcionando a grata surpresa de que ninguém morre por trabalhar alguns dias das folgas que o calendário antecipou.
    O país começou a trabalhar antes.
    Cobranças de parte a parte, o governo continua com suas explicações inócuas sobre o que não ia fazer de ruim, mas fez. A manutenção da dependência assistencialista oficial para milhões de brasileiros que podem trabalhar deve continuar, aumentando a relação de dependência, que no amanhã deverá cobrar a altos preços a retórica ilusória.
    A competição política está ganhando cada vez mais vulto, pois não tolera traições, nem esquecimentos e no tempo certo realçará seus defeitos, correndo riscos de que não haja diálogos fortes que assumam uma postura de tolerância prejudicando a todos.
    O ano começa com um imenso déficit de amor.
    As relações entre pessoas se apresentam cada vez mais difíceis. Pode ser necessidade de enquadramento de um que sempre esteve ao lado do outro, mas ainda não satisfez seu desejo, ou não aprendeu o que é carinho ou afetividade.
    Por mais que se queira mostrar uma imagem diferenciada, as pessoas reprimem a arte da convivência que só aumenta os desafios acentuando os desníveis existenciais com reais diferenças.
    Tudo é indefinição.
    Esquecemos que somos almas afins nos degraus evolutivos. Confiamos nos outros, mas com restrições sem que haja um espaço em que prevaleça o coração.
    Ora veja meu caro leitor ou cara leitora, você deve estar se perguntando com que compromisso que eu voltei? O que será que eu estou querendo dizer?
    Quero dizer que em mais este ano o esforço deve ser de cada um, mesmo sabendo da existência de uma imensidade de grupos que podem ajudar a iluminar os caminhos, mas, além de serem poucos não sabem ainda a magnitude da obrigação que assumiram e a luz que tem.
    O Juiz Maior fala do princípio da diferença entre o velho e o novo, entre o forte e o fraco, mas nós ainda não entendemos que devemos habilitar estas pessoas para enfrentar os desafios que o país e a vida oferecem sem que tragam constrangimento para alguém.
    Só Ele sabe o que nos reserva o dia de amanhã.
    Cabe a nós tolerar e superar as diferenças que tendem a ser superlativas, quando intelectuais ou financeiras, por falta de atenção as cobranças naturais que ocorrem em detrimento ao amor que se solidifica nas afinidades e igualdade entre pessoas.
    Feliz 2010.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Mau Uso da Palavra




   Portugal 1 x Brasil 0
   De repente o gol inesperado.
   Portugal saiu na frente.
   A conferência de líderes parlamentares de Portugal adotou a recomendação para que no debate político, os intervenientes não mais se acusem uns aos outros de autistas.
   Essa recomendação foi adotada na Assembléia Nacional portuguesa, por unanimidade, estabelecendo que os políticos não mais se acusem uns aos outros de autistas, principalmente fazendo da síndrome uma arma política para depreciação de pessoas.
   Politicamente correto, pois parece simples porque foi em Portugal não é mesmo?
   Não. Não deve ter sido tão simples assim, já que no Brasil isso ainda não aconteceu porque além de difícil, nesses assuntos de discriminação e preconceito o jogo por aqui é duríssimo por aqui e sempre tem prorrogação.
   O político brasileiro, sem generalizar é claro, orientado para usar propaganda enganosa, corrompe e distorce as palavras de acordo com o oportunismo que lhe convém.
   O mau uso da palavra autista aumentou ciclicamente a partir da síndrome da corrupção que assolou o atual governo, quando políticos que não perdem tempo para falar mal de outras pessoas, no final se perdem em suas próprias palavras, sem saber que estão atingindo gravemente a quem nada tem a ver com as suas atitudes recrimináveis, causando traumas e danos irreparáveis.
   Se a questão é falar mal de alguém ou de alguma coisa, que nem sabe o que falou, para benefício próprio, não é preciso pensar que se está acima de tudo.
   Sem querer ser mágico ou adivinho, esse evento no âmbito político português poderá ser uma espécie de desafio para outros países começarem o mesmo procedimento.
   Imagino que minhas parcerias das lides autísticas, começam a pensar que não perderam tempo em bater sempre na mesma tecla, combatendo, brigando, esclarecendo que o mau uso da palavra autista, estava sendo usado para colocar defeitos na vida e na conduta dos outros, favorecendo o estigma da discriminação e do preconceito contra o portador da síndrome.
   Confesso que já estava cansado, mas nunca perdi a esperança de que um dia o vento poderia começar a soprar na direção do autista para este conquistar seu lugar no contexto de ser bem aceito na vida, pelo menos defendido, mesmo que contrariando regras obrigatórias em favor de todo ser humano.
   Quem sabe esse vento sopre até encontrar o ponto de equilíbrio para chegar ao caminho que não sabe, não lhe interessando o outro extremo, pois os autistas tendem repetir os seus estereótipos fora do contexto político ou da cultura que estão inseridos. São soberanos despreocupados com mesquinharias.
   A palavra é uma das mais poderosas ferramentas que o ser humano possui, embora seja uma faca de dois gumes, além de poder criar um sonho ou destruir tudo, o mau uso dela, também pode gerar um ferimento profundo. Por isto se diz que “As palavras são como plumas jogadas ao vento”. Não há como juntá-las novamente.”
   O mau uso da palavra autista dependendo da forma como é usada, pode libertar ou aprisionar mais ainda o seu portador, já que “A mente do ser humano é fértil, mas apenas para as sementes para as quais é preparada: se para sementes do amor ou ódio; da mentira ou da verdade; do medo ou da coragem e discernimento.”
   Pais de autistas, no sentido duplo da palavra, também devem ser cuidadosos com o uso da palavra, para que ela não se volte contra si mesmo. Quem nunca usou mal uma palavra, ou quem nunca falou mal de alguém, que me atire a primeira pedra.
   Sempre que escutamos uma opinião e acreditamos nela, fazemos um compromisso que se torna parte do nosso sistema de crenças, como aquelas mentiras implantadas em nossa mente num momento em que nossa atenção foi captada e estava receptiva para aceitar como verdade.
   Nos eventos do Dia Mundial de Conscientização sobre o Autismo, um senador brasileiro expressou em Plenário seu temor que estados e municípios, com tantas dificuldades na área de saúde, "não apliquem recursos para as necessidades da pessoa com deficiência”, mas que "criem a cultura, consolidem os serviços e acertem os encaminhamentos necessários" para atender os deficientes físicos, intelectuais e autistas.
   Já escrevemos sobre o “Autismo Político” que surgiu como protesto de quem não gosta de ver a palavra que caracteriza a síndrome como uma fonte de insulto ou crítica política.
   Se fizermos um compromisso conosco mesmo, apenas com a intenção do bom uso da palavra autista para manifestações por nossos filhos, autistas ou não, estaremos ensinando a usá-la em direção da verdade e do amor.
   O exemplo veio de além mar.