No Brasil o discurso sobre inclusão de pessoas com deficiência quer seja na escola, trabalho, lazer, espaços sociais tem sido ainda uma utopia. As mudanças de fato estão sendo forjadas por grupos de pais mais organizados, educadores, alguns líderes políticos, entidades, ONGs e os meios de comunicação. Está caminhando a passos curtos, mas caminhando em alguns locais, regiões.
A preocupação reside ainda, somente com os resultados quantitativos como, por exemplo, quantos alunos com deficiência estão matriculados nas escolas do Brasil, do que com os resultados qualitativos das relações com aprendizagem e conhecimento, que seria importante saber, por exemplo, de que maneira estes alunos estão matriculados, como estão sendo atendidas as necessidades singulares destes alunos, como estão aprendendo, se relacionando, se estão felizes e realizados. Do ponto de vista dos professores, as perguntas recairiam, estão sendo capacitados e aprendendo de fato, mudaram suas atitudes, o currículo e avaliação da escola foram modificados e o plano político pedagógico, há cooperação entre a saúde e educação para atender os casos de alunos com autismo, dentre outros que precisam de atendimento clínico especializado, e viriam muitas outras indagações, sem falar das questões da família que vamos ponderar mais abaixo.
Perguntas estas que não calam, mas ficam veladas a espera de atitudes mais eficientes e humanizadoras. Muitas ações de políticas públicas do governo federal estão sendo efetivadas e apoiadas no âmbito estadual e municipal. Contudo, as escolas estaduais por serem maiores em demanda de alunos sendo que na mesma proporção acontece com o numero de seus professores que precisam ter formação para compreenderem a educação inclusiva, são as que apresentam as maiores dificuldades em relação às escolas municipais e particulares. O Ministério da Educação tem em seu bojo uma proposta de vanguarda, mas as dificuldades são de ordem pragmática, ou seja, políticas públicas mais eficientes, investimentos em formação e materiais pedagógicos (tecnologias assistidas), trabalho e investimento para mudança cultural de atitudes ainda preconceituosas e falta de informação para a população geral.
A Educação Inclusiva não se restringe a educação, mas uma forma social de relacionar-se com o ser humano. É um processo árduo, desafiador mudar a cultura do ser humano!
O que observamos é que cada um faz uma parte que nem sempre forma um todo convergente, um emaranhado entre leis, projetos, iniciativas, verbas, metodologias que por muitas vezes se desencontram da concepção humanística, tornam-se apenas uma retórica universitária ou um projeto político fugaz.
A educação inclusiva é um direito humano, é uma educação de qualidade e precisa ter um bom senso social. Uma escola inclusiva é aquela que encoraja todas as crianças a aprenderem juntas, colaborando e cooperando mutuamente. Uma escola que discorde da prática de separar as crianças em capazes e incapazes. Uma escola que concorde que todas as crianças são capazes e que cada criança é capaz a seu modo. Uma escola que admite que cada criança aprende de um jeito só dela e, por isso, tem o direito de aprender do jeito dela. Uma escola que ensina o que as crianças querem e precisam aprender em função da situação de vida de cada criança. Uma escola que faça das crianças felizes!
Mas ainda as escolas estão focadas para que as crianças passem no vestibular, sejam competitivas, individualistas que é bem diferente de ser independente e autônoma.
Partimos do pressuposto de que entendemos a Educação Inclusiva como sendo um conceito muito mais amplo do que o de inserção do aluno com deficiência nas escolas regulares, como é resumidamente pensado, mas com uma visão mais expansiva do caminho a ser percorrido por este sujeito, desde a hora do seu nascimento, com uma acolhida planejada e articulada entre os profissionais das diversas áreas. Parto do princípio de uma inclusão programada e gradativa, responsável passo a passo dentro de um referencial ético. Tanto para quem está sendo incluído podendo ser “a criança, jovem, adulto, a família”, todos estão saindo de um modelo de exclusão, todos estavam ou estão em alguma medida institucionalizada quer seja em escolas especiais, classes especiais ou qualquer outra forma de exclusão social marginal.
O trabalho em conjunto com a família é fundamental não existe inclusão se a família não fizer parte do processo, muitas vezes só trocamos o aluno de lugar a os pais continuam reagindo da mesma forma, não há apoio, não há compreensão, apenas a necessidade de resultados. A família também precisa ser incluída, desde a sensibilização aos professores e capacitação continuada, enfim todos deverão fazer parte do processo.
Numa outra perspectiva, constatamos uma inegável mudança de postura, de concepções e atitudes por parte de educadores, pesquisadores, de agentes sociais, formadores de opinião e do público em geral. Estas mudanças se traduzem na incorporação das diferenças como atributos naturais da humanidade, no reconhecimento e na afirmação de direitos, na abertura para inovações no campo teórico-prático e na assimilação de valores, princípios e metas a serem alcançadas.
Também precisamos de medidas que visem assegurar os direitos conquistados, cada vez mais à melhoria da qualidade da educação, e investimentos em uma ampla formação dos educadores, a remoção de barreiras físicas e atitudinais, a previsão e provisão de recursos materiais e humanos entre outras possibilidades. Nesta dimensão se potencializa um movimento de transformação da realidade para se conseguir reverter o percurso de exclusão de crianças, jovens e adultos com ou sem deficiência no sistema educacional.
Alguns dos trabalhos mais recentes realizados por Edgar Morin (2002) para a Unesco tentam responder a interrogações que nos esperam a cada dia quando entramos na sala de aula: o que a escola tem para ensinar?
Ensinar as cegueiras do conhecimento: dar a oportunidade de aprender sobre a ilusão e os “erros da mente”; ensinar os princípios do conhecimento pertinente: ensinar a interpretar o contexto e a resolver problemas; ensinar a condição humana: ensinando que o ser humano é ao mesmo tempo físico biológico, psíquico, cultural, social e histórico, ensinar a identidade terrena e a história da terra: para que se compreenda desde idades tenras que o destino do homem está intimamente ligado ao destino da terra e da natureza.
Enfim acredito, aposto na utopia da escola inclusiva. Posso dizer que sofro de “utopismo”, que consiste na ideia de idealizar não apenas um lugar, mas uma vida, um futuro, ou qualquer outro tipo de coisa, numa visão fantasiosa, sonhadora e normalmente contrária ao mundo real.
O “utopismo” é um modo absurdamente otimista de ver as coisas do jeito que gostaríamos que elas fossem. E se os sonhos podem ser transformados em realidade, então vamos lá, mãos a obra!
Drª Marina S. Rodrigues Almeida
Psicóloga, Psicopedagoga e Consultora de Educação Inclusiva
Publicado em UOL - 22.11.2011
Foto UOL
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