"Ele está perguntando: 'Você é humano ou
máquina?'", diz Tobias Ussing enquanto seus dedos correm pelo teclado.
Tobias está codificando seu computador para colher
dados sobre como uma empresa pode chegar ao topo da lista de resultados quando
a palavra "contêiner" é escrita no Google. Uma seção na tela lhe pede
para digitar algumas letras, como controle de segurança.
Politiken
"Sim, sou humano", diz Tobias, e com
velocidade
instintiva digita as letras embaralhadas na tela.
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"Sim, sou humano", diz Tobias, e com
velocidade instintiva digita as letras embaralhadas na tela.
Tobias não se incomoda quando é descrito como nerd.
E não se incomoda quando é chamado de especialista. Mas o especialista em
dados, que tem 30 anos, não gosta de ser encaixado em uma categoria: autista.
Apesar de ter recebido o diagnóstico do autismo, uma disfunção do
desenvolvimento, quando tinha 14 anos de idade.
"Uma vez fiz um exame de sangue, e a enfermeira
perguntou se eu tinha algum problema. Falei que tinha autismo e ela disse:
'Você pode voltar quando estiver bem de novo'", ele conta, sorrindo.
"Há tanto preconceito, tanta ignorância em
relação ao autismo. As pessoas parecem sentir a necessidade de enquadrar você
numa categoria. Mas dizer que todos os autistas são iguais é como dizer que
todas as pessoas que têm um braço quebrado são iguais."
O governo americano estima que 1% da população
mundial tenha alguma forma de autismo.
Estudos dinamarqueses e internacionais mostram que
até oito em cada dez autistas são excluídos do mercado de trabalho, a um custo
altíssimo para a sociedade.
Tobias Ussing ficou desempregado por dois anos, até
entrar em contato com The Specialists, seis meses atrás. Entidade dinamarquesa
sem fins lucrativos, o objetivo da The Specialists é mudar a visão convencional
do autismo, levando as pessoas a enxergá-lo não como desvantagem, mas como
vantagem.
Um benefício ao indivíduo, para as empresas e para a
economia da sociedade. Com frequência os autistas podem ser destituídos de
habilidades sociais e precisar de estrutura e segurança; ao mesmo tempo, porém,
podem possuir habilidades singulares.
Tobias é um dos 35 autistas empregados na Dinamarca
pela The Specialists como consultores de informática. Ele passa 20 horas
semanais resolvendo tarefas de informática para clientes de empresas e do setor
público. Suas tarefas incluem testar algumas páginas e livrá-las de bugs, ou,
como sua tarefa atual, otimizar sistemas de busca. Ele aponta para uma planilha
na tela e explica que o sistema agora colhe dados sobre quantas pessoas estão
on-line à procura de respostas sobre vendas de contêineres.
"Digitar tudo isto manualmente levaria várias
horas, mas deste jeito demora apenas dez minutos", ele revela.
O fundo de pensões dinamarquês ATP há um ano emprega
um grupo de consultores da Specialists. A gerente de seção Vibeke Brask afirma
que os seis consultores precisam de menos agitação à sua volta e mais
informação direta que os outros funcionários. Por outro lado, eles otimizaram o
atendimento ao consumidor e os procedimentos de trabalho para lidar com casos,
graças à sua perseverança e seu dom inigualável para o reconhecimento de
detalhes e padrões.
"Eles começaram com tarefas simples de
atendimento de casos, mas em pouco tempo observaram detalhes ou estruturas que
poderiam ser transformados em maneiras melhores de fazer coisas. Há muito
poucos erros, e eles são capazes de trabalhar com listas longas que os outros
simplesmente não conseguem. Quanto à motivação, muitos de nossos funcionários
achariam insuportável fazer o que os Specialists conseguem fazer por várias
horas a fio. Eles dão conta de muito mais do que nos foi dito e têm sido um
trunfo real para nós", comenta Brask.
A The Specialists foi fundada dez anos atrás por
Thorkil Sonne, que abandonou uma carreira promissora no grupo de
telecomunicações TDC. Seu filho tinha nascido com autismo e, como acontece com
a maioria das pessoas que recebem esse diagnóstico, poderia prever uma vida
inteira de manutenção passiva.
"A Specialists foi fundada não como empresa
para criar um emprego para meu filho, mesmo porque eu não tinha ideia do que
ele ia querer fazer. O objetivo era mudar a atitude da sociedade em relação a
ele e a todas as outras pessoas com autismo, para que encontrassem mais
compreensão e tivessem opções melhores na vida", diz Sonne.
Sua meta era conseguir mil empregos para autistas, e
essa meta está perto de ser alcançada. Com o sucesso do programa e a atenção
internacional que vem recebendo, sua ambição também já cresceu. Agora a meta é
criar 1 milhão de empregos para autistas.
Hoje a The Specialists e sua Specialist People's
Foundation estão representados em nove países. Os países mais recentes a
figurar na lista são a Espanha e os Estados Unidos. Em maio deste ano, a
família Sonne se mudou para o Estado de Delaware. A partir de sua nova base, a
organização finalmente conseguiu seu grande avanço internacional.
O grupo alemão de software SAP é o mais recente a
ter formado uma parceria com a The Specialists para a criação de 650 empregos
até 2020 para autistas na seção de informática --ou seja, 1% da força de
trabalho global da empresa.
E, contando com o apoio do governador do Delaware,
Jack Markell, Sonne formou um acordo de parceria nos EUA com o grupo global de
informática CAI. Pelo acordo fechado, o CAI vai criar cem empregos para
americanos com autismo nos próximos 2,5 anos. O grupo diz que os empregos mais
comuns envolvem programação e testes de softwares, entre outros.
"As pessoas se definem por suas habilidades, e
não suas disfunções. Ao empregar pessoas com autismo, o CAI se mune de talentos
únicos que beneficiarão sua rentabilidade. Hoje em dia, mais que nunca, a
competitividade de nosso Estado e nosso país depende de fazermos uso do
potencial pleno da sociedade --o potencial pleno de todos", diz o
governador Markell.
Nos Estados Unidos, a The Specialists também iniciou
discussões com a gigante da informática Intel e com a maior rede varejista do
mundo, Walmart.
Sonne afirma que a Specialists chegou aos EUA no
momento certo. Cada vez mais pessoas vêm recebendo o diagnóstico de autismo; a
cifra mais recente é de uma em cada 50 pessoas.
Ao mesmo tempo, a Associação Nacional de
Governadores proclamou 2013 o ano da promoção do emprego para pessoas com
deficiências.
"Essas parcerias me dão orgulho e
alegria", declara Sonne. "Esse modelo nos ajudará a alcançar nossa
meta de gerar 1 milhão de empregos. Aqui nos EUA testemunhei envolvimento muito
forte entre os atores locais. A atitude americana de 'vamos fazer!' é muito
diferente da atitude europeia, um pouco mais relutante em entrar em contato com
o problema."
"Isso é lamentável, já que os autistas são
capazes de desempenhar toda sorte de tarefas no setor da tecnologia de
informação, na indústria farmacêutica e no setor financeiro. Na realidade,
creio que pelo menos 5% das tarefas em qualquer setor econômico seriam
perfeitas para autistas, já que eles sentem satisfação em exercer empregos que,
antes, não davam satisfação a ninguém."
FONTE:
Tradução de CLARA ALLAIN
Tradução de CLARA ALLAIN
JACOB SORGENDRI KJAER
DO
"POLITIKEN", DE COPENHAGUE
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