Alysson Muotri estuda neurônios criados com
células-tronco
de autistas.
O biólogo relata ter obtido resultados preliminares,
mas
positivos.
O biólogo brasileiro Alysson Muotri, professor da Faculdade de
Medicina da Universidade da Califórnia, em San Diego, nos EUA, relatou ter
obtido resultados preliminares, mas promissores, em pesquisas com medicamentos
para tratar efeitos do autismo em crianças.
Analisando os genes de pacientes e reprogramando células-tronco
obtidas a partir de células comuns para que elas se tornem neurônios, o
cientista e sua equipe têm estudado em laboratório drogas que ajudem a reduzir
as limitações presentes em autistas.
Em uma das pesquisas, apresentada em congressos, mas ainda não
publicada em revista científica, Muotri aponta ter encontrado vínculo entre
mutações genéticas que prejudicam a formação de sinapses (ligações) dos neurônios
e alterações causadas pelo autismo. O estudo com uma criança que apresenta uma
forma específica de autismo apontou que ela tem um gene defeituoso que
dificulta a entrada de cálcio nos neurônios, o que atrapalha a proliferação das
sinapses.
Os pesquisadores retiraram células comuns da criança e fizeram com que
elas voltassem a ser células-tronco. Depois, elas foram reprogramadas para se
tornarem neurônios. Eles, então, testaram medicamentos para estimular em
laboratório o bom funcionamento do gene. "Todo mundo tem duas cópias de
cada gene. No caso desta criança, ela tem uma cópia que está mutada [sofreu
mutação] e outra que é funcional. Achamos uma droga que estimula o gene ativo a
‘funcionar’ em dobro", disse Muotri, que é pós-doutor em neurociência e
células-tronco pelo Instituto Salk de Pesquisas Biológicas, também na
Califórnia.
O medicamento que estimula o receptor de cálcio
respondeu bem aos testes em laboratório e passou a ser administrado ao paciente
diluído em chá, para avaliar os resultados. As primeiras observações, após um
mês, mostram que a criança tem progredido em atenção e sociabilização.
"Avaliamos através de questionários aplicados para os pais, professores,
amigos da criança. Fizemos uma observação antes e depois da droga", aponta
Muotri.
"Os dados que obtivemos depois de um mês são
promissores, eles mostram melhora na atenção e na sociabilidade da
criança", relata o professor. "Não é tão significativo porque tivemos
que dar uma dose pequena", pondera, mas a descoberta é importante.
"Abre uma perspectiva que estamos chamando de medicina personalizada.
Baseado no genoma da pessoa e em testes com células-tronco induzidas, pode ser
possível definir qual a melhor droga e a melhor dose a ser usada em um
indivíduo", diz.
O caso do autismo é singular porque há vários tipos
de distúrbios, causados por situações e mutações distintas. "Dificilmente
você vai encontrar uma droga que vale para todo mundo", avalia Muotri. Ele
diz que o tratamento que está sendo proposto, o da medicina personalizada, é
similar ao que ocorre com alguns tipos de câncer. "Você retira algumas
células e vai testando, até encontrar o medicamento e a dose certa."
Cérebro maior
O grupo capitaneado por Muotri também está
investindo em outra linha de pesquisa - analisar dez crianças autistas com
quadro clínico parecido, de cérebro com tamanho maior do que o normal. Os
pesquisadores estão estudando se estes pacientes têm características genéticas
similares, como alguma mutação.
A hipótese dos cientistas é que, se as crianças têm
um cérebro grande, é porque elas têm mais neurônios do que o necessário para
sua idade - por algum motivo as células nervosas podem ter crescido
descontroladamente. "Nós estamos pesquisando drogas que inibam o
crescimento dessas células. A ideia é controlar o aumento, estamos fazendo
testes em laboratório", diz Muotri.
A previsão do professor é que essa linha de pesquisa
vai dar respostas mais rapidamente. "Proliferação celular é algo que é
estudado há muito tempo", pondera. "Talvez dois anos para começar a
ter resultados com drogas.”
Neurônios vivos
Um dos grandes problemas para entender o autismo é
conseguir obter neurônios vivos, ressalta Muotri. "Muitas vezes são usados
tecidos de autistas mortos, analisados depois que um paciente morre." Mas
o avanço de pesquisas em células-tronco pluripotentes induzidas (conhecidas
como células iPS, em inglês) está abrindo um novo caminho no estudo do autismo,
diz o professor.
"A ideia é pegar células do paciente - cabelo,
pele, polpa do dente - e fazer com que elas voltem a ser células-tronco. Então
você as induz a se tornarem neurônios", explica o cientista. Pesquisas
recentes apontam que o cérebro dos autistas, em geral, realiza menos sinapses
(ligações entre neurônios para transmissão de informações), o que está sendo
explorado nas pesquisas científicas.
"Começamos a testar medicamentos para elevar o
número de sinapses, e alguns deles têm funcionado. Drogas como o fator de
crescimento insulínico [IGF-1, na sigla em inglês]", diz Muotri. Um dos
problemas do IGF-1 é que é uma proteína muito grande, que não consegue ser bem
absorvida pelas camadas mais externas do cérebro. Moléculas menores estão em
estudo, afirma o professor.
A novidade dos pesquisadores é que os testes com
estas drogas até agora estavam restritos ao laboratório, e vão começar a ser
aplicados em pacientes em breve. "A fase clínica de toxicidade já foi
aprovada para alguns grupos que estão estudando crianças autistas. A ideia
agora é testar em um número maior de crianças, para saber se, com seis meses a
um ano de tratamento, elas estão melhores em diferentes aspectos, como
respiração, ansiedade", informa Muotri.
Nenhum comentário:
Postar um comentário