Bernardo Barahona Corrêa * |
Aquando da organização do simpósio “Psicopatologia
do Desenvolvimento” no Congresso
Nacional de Psiquiatria, as ideias sobre os conteúdos a abordar rapidamente se
condensaram em torno de duas patologias: Perturbações do Espectro do Autismo
(PEA) e Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA).
Tratando-se, evidentemente, de síndromes totalmente
distintos na gravidade das suas manifestações clínicas e no grau de
incapacidade de que se revestem, estas duas patologias não deixam ainda assim
de ter muito em comum. Ambas são fenótipos com início na infância e ambas se
prolongam até à idade adulta. Em ambas a comorbilidade é a regra e não a exceção.
Em ambas o diagnóstico correto pode ser difícil, sobretudo nos casos que apenas
na idade adulta chegam à atenção médica.
Com efeito, a metamorfose da psicopatologia ao
longo do desenvolvimento e a comorbilidade neuropsiquiátrica quase universal
colocam o adulto com PEA ou com PHDA não diagnosticadas em risco de não
diagnóstico, de omissão de tratamentos eficazes, ou de exposição a tratamentos
desnecessários ou mesmo nocivos.
Este risco é multiplicado pela flagrante ausência
deste grupo de patologias no típico percurso de formação do psiquiatra de
adultos, exclusivamente centrada nas perturbações mentais comuns e nos grandes
síndromes psicopatológicos da psiquiatria hospitalar. Em nenhuma outra
patologia o risco de erro de diagnóstico e de tratamento desnecessário ou
errado será porventura tão elevado como nas PEA.
Não raramente vemos adultos com PEA não
diagnosticadas receber um diagnóstico de psicose esquizomorfa sem qualquer
fundamente que não a bizarria do quadro clínico. Por outro lado, os sintomas
psicóticos podem complicar o quadro psicopatológico das PEA, frequentemente na
presença de comorbilidades neurológicas como a epilepsia.
No que respeita à PHDA, a subtileza da apresentação
no adulto, a crescente popularidade do conceito de PHDA do adulto - sem a
correspondente formação da maioria dos psiquiatras - e ainda a facilidade de
prescrição de estimulantes têm como resultado um elevadíssimo risco de sub e sobre
diagnóstico, com prescrição de estimulantes a quem não precisa, e diagnósticos
desadequados ou redutores a quem poderia beneficiar daquela forma de
tratamento.
Este foi um dos temas em debate no Congresso
Nacional da Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental.
* Membro da direção da Sociedade Portuguesa de
Psiquiatria e Saúde Mental
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