A maior fotografia da doença
revela que as mutações conformam o grande fator de risco
Crianças afetadas pelo autismo
aprendem através de pictogramas
em uma escola especial, em 2009. / EL PAÍS
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As causas do autismo são
discutidas há meio século e continuam sem estar claras, mas cada vez fica mais
evidente a transcendência dos fatores genéticos. Dois macroestudos apresentados
na revista Nature confirmam agora os fortes e complexos componentes genéticos
do autismo, identificam mais de 100 genes relacionados com o risco de
desenvolver a doença e revelam os três grandes mapeamentos pelos quais viaja
esse emaranhado de material hereditário. Dois deles – a formação das sinapses e
o controle dos genes cerebrais – eram de certo modo esperados, mas ninguém
contava com o terceiro: a cromatina, uma arquitetura de alto nível que empacota
ou expõe grandes áreas da geografia genômica em resposta ao ambiente.
Os resultados têm implicações
imediatas para o diagnóstico genético do autismo, que agora é formado por um
modesto 20% de capacidade de predição e poderá se multiplicar em poucos anos,
embora certamente com a introdução das modernas técnicas da genômica – o
sequenciamento de exomas, ou a parte do DNA que significa proteínas – ao
alcance dos serviços de psiquiatria hospitalar. Além disso, esses dados darão
trabalho durante muito tempo aos neurocientistas, que deverão esclarecer como
esses genes afetam o cérebro, e aos farmacêuticos, que poderão dirigir seus
dardos químicos contra toda uma nova bateria de alvos.
O autismo, que aparece mais ou
menos em uma de cada 100 crianças, é um transtorno de desenvolvimento que afeta
a capacidade social, de comunicação e de linguagem, e costuma ser evidente
antes dos três anos de idade. O autismo “clássico”, a síndrome de Asperger e o
transtorno generalizado do desenvolvimento não especificado (PDD-NOS pela sigla
em inglês) são três quadros relacionados que costumam se agrupar sob o
guarda-chuva de transtornos do espectro autista. Os macroestudos abrangem este
espectro em geral, e não apenas o autismo clássico.
Os resultados têm implicações
imediatas para o diagnóstico genético do autismo.
As mutações herdadas e de novo –
ocorridas nos óvulos ou no esperma dos pais, e que, portanto, dão lugar a casos
sem precedentes familiares – são o principal fator de risco para desenvolver o
autismo; somando os dois tipos de mutações, os dois novos estudos identificam
mais de 100 genes de risco. São, de longe, os maiores estudos sobre genética do
autismo feitos até o momento.
O primeiro envolveu 37
instituições científicas internacionais, incluídas duas espanholas, foi
coordenado pelo neurocientista e geneticista Joseph Buxbaum, do Hospital Monte
Sinai de Nova York, e analisou o genoma de 3.871 autistas e 9.937 controles
relacionados. O segundo foi coordenado por Michel Wigler, do Laboratório Cold
Spring Harbor, também em Nova York, e examinou o genoma de 2.500 famílias com
filho autista, com um foco particular nas mutações de novo, que podem superar
20% de todas as mutações de risco segundo sua análise.
Estas mutações de novo são parte
da razão pela qual a influência genética no autismo foi subvalorizada nos
primeiros estudos: apesar de ter uma causa genética, estes casos não
apresentavam relações familiares óbvias. “Mas as mutações de novo não são
nenhuma peculiaridade do autismo”, explica Ángel Carracedo, da Universidade de
Santiago de Compostela e coautor do primeiro trabalho. “Nossos óvulos e
espermatozoides sofrem mutação, é parte do mecanismo de geração da diversidade
humana.” A outra autora espanhola é Mara Parellada, da Universidad Complutense.
Bauxbaum, líder desse mesmo
estudo, acha que o consórcio não só contribuiu com a fotografia teórica mais
completa de como numerosas mudanças genéticas se combinam para afetar o cérebro
das crianças com autismo, “mas também sobre as bases do que torna os humanos
seres sociais”. Em termos lógicos, esses mesmos genes devem formar, quando
funcionam corretamente, a base lógica das estruturas sociais do cérebro.
Estes estudos contribuem para o
mapeamento teórico mais completo de como numerosas mudanças genéticas se
combinam para afetar o cérebro das crianças com autismo.
“Todas estas descobertas
genéticas”, continua Bauxbaum, “devem ser transportadas agora a estudos
moleculares, celulares e animais para conseguir futuros benefícios para os
afetados e suas famílias; um estudo como este cria uma indústria de muitos
anos, com laboratórios procurando os efeitos fisiológicos das mudanças
genéticas que encontramos e procurando fármacos para contrapor seus efeitos”.
“A genética que subjaz ao autismo
é altamente complexa”, acrescenta o segundo coordenador do estudo, Mark Daly,
do Instituto Broad (MIT e Harvard, e um dos pontos centrais do projeto genoma
público), “e apenas tendo acesso a grande amostras é possível traçar as
mutações e entender os mecanismos implicados”.
FONTE:
http://brasil.elpais.com/autor/javier_sampedro/a/
http://brasil.elpais.com/autor/javier_sampedro/a/
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