Assim como a Linda, representada pela
atriz Bruna Linzmeyer na novela Amor à Vida, da Rede Globo, que acabou na
sexta-feira, a filha da jornalista Carla Zomignani, 48 anos, Amanda, 19, quer
se casar. “Mas acho que ela não sabe o que significa ter um relacionamento. Ela
liga mais o casamento às roupas, à festa. Não sei se consigo imaginá-la casada,
mas por que não?”
A personagem da novela gerou polêmica
entre aqueles que têm filhos autistas ou convivem com pessoas portadoras da
síndrome, de origem mental, mas causas desconhecidas. Muitos criticam o rápido
desenvolvimento de Linda, que passou do autismo severo não-verbal para o leve e
verbal por conta do amor que sente por Rafael (Rainer Cadete). “A Linda só
existe no mundo da fantasia”, garante o professor de Neurologia Infantil e
membro do Núcleo Especializado em Aprendizagem da Faculdade de Medicina do ABC,
Rubens Wajnsztejn.
O especialista acredita, porém, que
feitas as devidas ressalvas à ficção, é importante que a novela discuta assuntos
desse tipo. “Claro que os pais não podem achar que os filhos terão o mesmo
comportamento que a personagem. Cada autista é único, tem uma personalidade
única e um quadro único de sintomas.”
A jovem Amanda, diagnosticada aos 8, por
exemplo, não aprendeu a ler e escrever. Mesmo assim, Carla fez questão de
mantê-la em escola regular de currículo construtivista em Santos, cidade na
qual a família vive. “Ela participou inclusive da formatura com os colegas da
sua idade, e foi um momento marcante para ela, que sempre gostou de interagir
com as pessoas, apesar das dificuldades.”
Diferentemente de Amanda, o andreense
André Luiz Pinheiro, 42, foi diagnosticado há apenas um ano. O autismo leve,
antes chamado de Síndrome de Asperger, segundo classificação internacional de
doenças, nunca o impediu de se desenvolver intelectualmente. Ele é formado em
Pedagogia e está cursando a quarta pós-graduação, agora em Educação Especial.
“O diagnóstico me proporcionou entender quem eu sou e porque tenho certos
comportamentos considerados estranhos pelos demais, como a dificuldade para me
relacionar e criar empatia. Meu sonho, agora, é ajudar crianças autistas a
desenvolver suas potencialidades”, diz o hoje funcionário público da Prefeitura
de Santo André.
Pinheiro mora com os pais e acredita que
é possível que autistas se casem, como a personagem Linda. No entanto, essa
oportunidade nunca apareceu para ele. “Tudo depende de como a pessoa é. Não
adianta julgar.”
Mesmo sem uma companheira, ele leva vida
ativa: além de trabalhar e estudar, dá aulas de informática na paróquia que
frequenta, atua como palhaço em comunidades carentes e mantém a rádio on-line
www.radioxiririca.com.br. Em meio a tudo isso, encontrou tempo para escrever
suas memórias no livro O Mistério do Palhaço Azul, cor que faz alusão ao
autismo.
A SÍNDROME
Trata-se de uma alteração mental que
afeta a capacidade de comunicação e de socialização, dificultando
relacionamentos. As pessoas diagnosticadas como autistas também têm alterações
de comportamento, ou seja, não respondem apropriadamente aos estímulos
ambientais. O autismo acomete um a cada 110 nascidos vivos, em média. As causas
são desconhecidas, mas estudos internacionais apontam fatores genéticos e
ambientais. O tratamento é baseado em terapia comportamental e ocupacional.
Na região, faltam centros especializados
Por ser considerado alteração mental, o
autismo é geralmente tratado pela rede pública de Saúde da região nos Caps
(Centros de Atenção Psicossocial). O funcionário público André Luiz Pinheiro,
portador da síndrome, critica a falta de profissionais especializados,
principalmente no caso de adultos. “O único neurologista que conseguiu me
diagnosticar é da Capital, e nem o meu convênio cobre. Gasto R$ 300 por
consulta a cada 6 meses.” A psicoterapia comportamental é feita na Apae
(Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais), mas também é paga: custa R$ 45
a sessão.
Em Santo André, a Rede de Atenção
Psicossocial atende pessoas com autismo. O paciente é incluído em escolas,
terapias e atividades físicas. Na Educação, há 145 alunos com autismo
matriculados na rede de ensino, do total de 1.112 deficientes incluídos.
Em Mauá, autistas podem ser atendidos
tanto nos Caps quanto no Centro de Reabilitação. São desenvolvidos projetos
terapêuticos adaptados a cada caso, podendo contemplar atendimentos em
assistência social, psicoterapia, psiquiatria, terapia ocupacional,
fonoaudiologia, fisioterapia e nutrição. Na rede municipal de Educação, são 30
os alunos autistas matriculados.
Em São Caetano, a Prefeitura oferece
tratamento no Ambulatório de Saúde Mental Dr. Ruy Penteado e na Unidade de
Saúde da Criança e do Adolescente Amabili Moretto Furlan. A rede de ensino
conta com 60 estudantes matriculados e o atendimento terapêutico é feito na
Fundação Municipal Anne Sullivan.
No Caps Infantil de Diadema, 37,5% do
total de pacientes pertence a alguma faixa do espectro autista, o que
representa 98 jovens. Na área da Educação, 128 crianças com transtornos do
espectro autista estão matriculados na rede municipal de ensino.
Em Ribeirão Pires as crianças com
suspeita de autismo são encaminhadas pelas escolas para a Apraesp (Associação
de Prevenção, Atendimento Especializado e Inclusão da Pessoa com Deficiência),
onde é agendada avaliação com equipe multidisciplinar da entidade, que também
oferece terapias. Há hoje 14 alunos autistas incluídos em escolas municipais na
cidade.
Por:
Camila Galvez
Do Diário do Grande ABC
Fonte:
http://www.dgabc.com.br/Noticia/508024/autismo-na-ficcao-e-diferente-da-vida-real?referencia=ultimas-editoria