Não é uma doença. E, definitivamente,
o indivíduo
dentro do espectro do autismo não pode,
nem deve, ser tratado como doente
Marilize, Mariangela e Ana Paula acompanham de perto toda a rotina das crianças (Foto: Camila Tsubauchi/ Diário) |
“Sou a Ana Paula, mãe das gêmeas Caroline e
Gabriela que hoje têm seis anos. Quando elas tinham três, recebemos o
diagnóstico de que elas estavam dentro do espectro autista”. “Sou o Cleverson e
essa é a minha esposa Mariangela, somos os pais do Tiago de três anos, que
também está dentro do espectro”. “Meu nome é Jacieli, sou mãe do Caio de sete
anos e ele é autista”.
Frases como essas foram ditas inúmeras vezes na
noite de uma segunda-feira. As alterações se limitavam ao nome e idade dos
personagens, mas a conclusão era sempre a mesma: meu filho está dentro do
espectro autista. Era uma reunião de pais que, juntos, pretendem formar uma
associação guarapuavana que auxilie no tratamento de crianças, e até mesmo de
adultos, com diagnóstico de autismo.
Os encontros acontecem a cada 15 dias e são
coordenados pela psicóloga especialista no transtorno, Rosemeire Silva Pereira.
Foi dela a ideia de juntar os quase 20 pais em torno da mesma mesa. O objetivo
era compartilhar progressos, percalços e experiências do dia a dia das
crianças. “A gente precisa de apoio psicológico também. Temos altos e baixos
que não se pode acreditar”, contou Ana Paula dos Santos.
Rosemeire apresenta estudos, notícias e presta
esclarecimentos sobre o transtorno. Também são exibidos vídeos e
disponibilizados materiais que podem contribuir para o desenvolvimento das
crianças. Mas em duas horas, todos têm direito a falar. “Esse grupo é
justamente para nos dar um respaldo, para a gente ver que existem mais pessoas
dentro da mesma situação”, justificou Ana Paula.
Para Marilize Zanatta, mãe de Matheus, 8, é o
momento de compartilhar vitórias com quem as entenda como vitórias. Jacielide
Campos concorda e exemplifica. “Para os nossos filhos, escovar os dentes e
pentear o cabelo é uma dificuldade enorme”. Isso acontece porque a coordenação
motora fina dos autistas é diferente da exibida por crianças neurotipicas. Na
maioria das vezes, ela é limitada.
E é preciso ressaltar o termo “na maioria das
vezes”, pois não é difícil encontrar pacientes dentro do espectro com excelente
domínio dos movimentos. “O autismo não tem um padrão, cada um é diferente”,
disse a psicóloga. Matheus é exemplo disso. Com muito treino, o menino aprendeu
a tocar piano, mas por causa da agenda apertada, teve de interromper as aulas
por alguns meses.
Na semana passada, Marilize voltou à escola de
música com Matheus. “Ele se sentou na frente do piano e tocou como se nunca tivesse
parado”, contou ela, entre lágrimas. As reações de orgulho e alegria são
coletivas. Todos comemoram e apóiam o sucesso de suas próprias crianças e das
crianças dos outros. “Os pais precisam estar bem para cuidar bem dos filhos”,
desabafou Jacieli.
A associação
Há cerca de um mês, o ideal de fundar a associação
de pais e profissionais começou a tomar forma. A proposta partiu de Cleverson
Toledo, pai de Tiago, e foi aceita pela maioria. Ana Paula, que é advogada,
buscou se inteirar sobre a legislação vigente e os trâmites para registrar a
entidade. “Acredito que até o fim deste mês o estatuto esteja fechado e já
estamos indo atrás de uma sede própria”.
As psicólogas do grupo também estão envolvidas na
organização. Rosemeire trabalha em conjunto com Tamires Bareta para reunir
informações sobre a quantidade de pacientes diagnosticados em Guarapuava, não
diagnosticados ainda ou que recebem tratamento só uma vez por semana. Quando
tudo isso estiver pronto, a associação pretende lutar pela implementação de políticas
públicas em saúde.
“A rede pública não nos oferece nada. Temos duas
clínicas especializadas, uma em São Paulo e outra em Curitiba, que dão suporte
ao tratamento. Alguns pais pagam por essas clínicas e elas dão respaldo para
profissionais da cidade que vistoriam nossos filhos”, explicou Ana Paula. “É
uma equipe que nós mesmos montamos e é paga individualmente”, completou
Rosemeire.
Outro ponto que deve ser trabalhado pela associação
é o diagnóstico precoce do espectro autista. Estudos apontam que a idade ideal
para início do tratamento é até os 3 anos de idade. Segundo Rosemeire, “em
Guarapuava, existem crianças de 12 anos que os médicos ainda afirmam que não
têm nada. Nessa idade, a gente já perdeu um tempão que podia ter sido usado
para trabalhar as necessidades”.
Para fechar o laudo de diagnóstico, é necessária a
opinião de pelo menos três profissionais distintos: um neuropediatra, um
psicólogo e um fonoaudiólogo. Conforme Rosemeire, a constatação depende de uma
avaliação comportamental porque não existe exame de laboratório que identifique
o transtorno. “A gente vê muitos profissionais que não têm essa leitura e acaba
passando batido. Quando adulto, o prognóstico é menor”.
Os encontros de pais e profissionais de saúde
acontecem a cada 15 dias, sempre nas noites de segunda-feira. Informações
adicionais podem ser obtidas com a psicóloga Tamires Bareta pelo telefone (42)
9984-9395.
• Entenda o autismo
Não é uma doença. E, definitivamente, o indivíduo
dentro do espectro do autismo não pode, nem deve, ser tratado como doente. Isso
é preconceito. Entre os pais, não faltam histórias de discriminação nos mais
diversos meios: escola, trabalho, supermercado e até mesmo em órgãos públicos.
Esses episódios são fruto da falta de conhecimento
sobre o transtorno – uma falta muito comum na sociedade em que vivemos. “Quando
o médico me falou que o Caio tinha autismo, lembrei da única coisa que já tinha
visto sobre, a propaganda que passava na televisão com a Mônica e o Cebolinha”,
contou Jacieli.
A campanha foi desenvolvida pela Ama (Associação de
Amigos do Autista) e destacava as reações da criança autista frente a
atividades simples do dia a dia. Mas não faltam opções no cinema e na
literatura que tratam do tema. Separamos algumas sugestões de filmes que têm
personagens autistas em sua trama.
• Rain Man (1988)
Charlie (Tom Cruise), um jovem yuppie, fica sabendo
que seu pai faleceu. Eles nunca se deram bem e não se viam há vários anos, mas
ele vai ao enterro e ao cuidar do testamento descobre que herdou um Buick 1949
e algumas roseiras premiadas, enquanto um “beneficiário” tinha herdado três
milhões de dólares. Curioso em saber quem herdou a fortuna, ele descobre que
foi seu irmão Raymond (Dustin Hoffman), cuja existência ele desconhecia.
Autista, Raymond é capaz de calcular problemas matemáticos com grande
velocidade e precisão. Charlie sequestra o irmão da instituição onde ele está
internado para levá-lo para Los Angeles e exigir metade do dinheiro, nem que
para isto tenha que ir aos tribunais. É durante uma viagem cheia de pequenos
imprevistos que os dois entenderão o significado de serem irmãos.
• Tão Forte e tão perto (2012)
Oskar Schell (Thomas Horn) é um garoto muito
apegado ao pai, Thomas (Tom Hanks), que inventou que Nova York tinha um
distrito hoje desaparecido para fazer com que o filho tivesse iniciativa e
aprendesse a falar com todo tipo de pessoa. Thomas estava no World Trade Center
no fatídico 11 de setembro de 2001, tendo falecido devido aos ataques
terroristas.
A perda foi um baque para Oskar e sua mãe, Linda
(Sandra Bullock). Um ano depois, Oskar teme perder a lembrança do pai. Um dia,
ao vasculhar o guarda-roupa dele, quebra acidentalmente um pequeno vaso azul.
Dentro há um envelope onde aparece escrito Black e, dentro dele, uma misteriosa
chave. Convencido que ela é um enigma deixado pelo pai para que pudesse
desvendar, Oskar inicia uma expedição pela cidade de Nova York, em busca de
todos os habitantes que tenham o sobrenome Black.
FONTE:
Diário
de Guarapuava
Camila
Tsubauchi
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