João Aoqui, de 11 anos, é o primeiro autista a
participar de competições no Brasil; garoto tem transtorno afetivo bipolar e
síndromes de Tourette e Asperger
DIAGNÓSTICO - EQUOTERAPIA - COMPETIÇÕES - MELHORAS - PRECONCEITOS
João Aoqui é o primeiro competidor com autismo a
disputar a prova dos Três Tambores no Brasil. Mas antes de entrar para a
história do esporte, o garoto de 11 anos teve de enfrentar barreiras
desagradáveis de transtornos e sofrimentos - pessoal e familiar -, superado
pelo trabalho, estudo e dedicação de uma equipe de equoterapia, que serão
contados nas linhas a seguir.
Equoterapia: o melhor dos remédios para amenizar o
sofrimento de João Aoqui
(Foto: Cleber Akamine)
DIAGNÓSTICO
O grito no amanhecer sinalizava o despertar de uma
criança transtornada. Um autismo provocado pelas síndromes de Tourette e
Asperger, mais um transtorno afetivo bipolar, causava reações físicas e
principalmente psíquicas desesperadoras na família Aoqui. Ele tinha apenas
cinco anos quando Adriana e Carlos Eduardo, mãe e pai de João, tiveram
conhecimento sobre o distúrbio.
Ele acordava pela manhã e gritava, chorava, dizia
que nós não o amávamos e que fugiria de casa. Tivemos que esconder as chaves em
alguns momentos. Tive que andar por duas horas com ele, "até o fim desta
rua", por causa da sua inquietação. Passamos por situações desesperadoras
- explicou a mãe que, desde então, passou a buscar soluções em diferentes
clínicas e consultórios. E foram inúmeras respostas.
Um médico recomendou uma espécie de "prisão
domiciliar" para evitar conflitos com outras pessoas. Outro chegou a
indicar uma internação em hospital psiquiátrico, mesmo este sendo apenas para
adultos. E todos receitavam remédios. À medida que eles eram aplicados, o
organismo de João, ainda em desenvolvimento e em fase de crescimento, começava
a responder negativamente. O fígado, órgão mais afetado, estava com os dias
contados.
- Ele não tinha outra saída. Era preciso parar com
a medicação pois o fígado estava sendo atacado - disse Adriana. Surgiu, então,
a indicação da equoterapia.
EQUOTERAPIA
Quando chegou ao haras pela primeira vez, em
novembro de 2013, João não tinha forças para subir no cavalo. As dificuldades,
do caminhar à concentração, eram enormes e dificultavam as primeiras
cavalgadas.
- Ele chegou muito debilitado, com dificuldades no
andar, sem forças na perna - contou a treinadora Francine Baldo, competidora
dos Três Tambores e equoterapeuta.
Francine Baldo, Adriana e Carlos Eduardo Aoqui acompanharam a aventura de
João na arena do Parque do Peão de Barretos
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Após nove meses de treinos, João Aoqui cavalga
sozinho nas arenas
Aos poucos, aberto à nova experiência, João se
familiarizou com o cavalo, com as pistas, com esporte. A ansiedade baixou, o
comportamento melhorou e, em três meses de atividades, os resultados eram
perceptíveis aos olhos de quem pouco entendia do assunto.
- Ele
estava ficando em cima do cavalo sozinho. Mais do que isso, ele mudou
completamente a forma de se relacionar com as pessoas. O comportamento era
outro - comentou a mãe.
Além de cavalgar, Francine Baldo explicou que João
participa diretamente no trato do animal. Ele pega o cavalo na cocheira,
escova, dá banho e até ajuda na alimentação.
- Esse contato é ótimo porque as pessoas com
necessidades especiais costumam apresentar movimentos bruscos. Como o animal
exige essa calma, movimentos mais suaves, eles acabam trabalhando essa noção de
tempo e espaço. Isso melhora muito o comportamento - disse Francine, que citou
outros benefícios como equilíbrio e fortalecimento muscular.
COMPETIÇÕES
Nesta sexta-feira, João entrou pela primeira vez na
arena do Parque do Peão de Boiadeiro de Barretos, durante a 59ª edição do
rodeio mais tradicional do Brasil. Embora não existam registros oficiais em
outros países, João é considerado o primeiro autista a participar de uma
competição oficial.
- Nós pesquisamos em diversos países e não
encontramos resultados. O ingresso do João em competições é um sonho para mim.
Quero criar uma categoria dentro dos Três Tambores para pessoas com
necessidades especiais. Fico feliz com essa oportunidade dada a ele - comentou
Francine Baldo, que já havia acompanhado uma apresentação do João no Rodeio de
Americana.
MELHORAS
"A equoterapia nos devolveu uma vida". A
frase resume a sensação de alívio e o sentimento de uma mãe desesperada,
cansada de conviver com o sofrimento do filho. Ela jamais imaginara que um
tratamento como este traria um resultado positivo num curto espaço de tempo.
- Ele sofre bastante porque tem um sensibilidade
sensorial acima do normal. Ele tem dificuldades de interpretar um som, um
cheiro, um gosto. Tudo é exagerado e isso causa um transtorno muito grande. Só
que aos poucos ele foi melhorando. O principal sinal foi quando ele levou um
tapa de uma outra criança no parquinho de um restaurante e veio até a nossa
mesa, dizendo que apanhou. Em outra época, ele teria revidado. Isso é
gratificante - lembrou Adriana.
PRECONCEITOS
João ficou três anos sem frequentar uma escola.
Segundo a mãe, foram várias tentativas de colocá-lo em uma sala de aula - e
inúmeras negativas.
- As escolas não estão preparadas para receber
crianças com necessidades especiais e preferem pagar multas a receber uma.
Falei com pelo menos cinco e nenhuma delas o aceitou. O tratamento ajudou nesse
aspecto porque ele apresentou uma melhora de comportamento, facilitando esse
convívio, a aprendizagem, o relacionamento - explicou Adriana, que não esconde
o orgulho de vê-lo matriculado em uma escola.
João Aoqui treina duas vezes por semana em um haras
de Santa Bárbara D'Oeste (Foto: Cleber Akamine)
FONTE:
Fotos
Por Cleber Akamine
Barretos, SP
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