sábado, 14 de setembro de 2013

"É preciso criar leis contra a discriminação genética", diz historiador

O Congresso Mundial sobre Doença de Huntington, que começa amanhã no Rio, terá entre seus palestrantes um dos mais famosos portadores da mutação que causa esse mal neurodegenerativo incurável e fatal: o historiador Kenneth Serbin, conhecido pelo blog de Gene Veritas, pseudônimo que usou por mais de uma década.
Ainda livre de sintomas, Serbin decidiu manter seu cérebro estimulado com uma manobra radical: aos 53 anos, o professor da Universidade da Califórnia em San Diego está mudando de ramo.
Ele é especialista na história recente do Brasil. Tem dois livros publicados pela Companhia das Letras. Um deles é "Diálogos na Sombra "" Bispos e Militares, Tortura e Justiça Social na Ditadura", tema sobre o qual falará semana que vem na Comissão da Verdade da Assembleia Legislativa de São Paulo.
                                                                                                        Nick Abadilla 
O historiador Kenneth Serbin com sua mulher, 
Regina Serbin, e a filha, Bianca
Nos últimos anos, Serbin começou a migrar para o campo da história da ciência. Na sua avaliação, a sociedade precisa de leis para amparar pessoas como ele, para que possam se preparar para doenças devastadoras sem medo de discriminação.
O gene associado com Huntington conta com trechos repetidos. Quem tem de 10 a 25 repetições é normal. Ter entre 36 e 39 repetições já implica risco considerável. De 40 em diante, é certo que a pessoa vai ter a doença. Serbin tem 40, assim como sua mãe, que morreu aos 48 anos.


Casado com a historiadora brasileira Regina Barros Serbin, que conheceu em 1991 num encontro às cegas no restaurante italiano Parmê do largo do Machado, no Rio, Serbin falou à Folha em português fluente.
*
Folha - Os EUA têm desde 2008 uma legislação contra a discriminação genética, mas no Brasil há um projeto de lei (4.610/98) esperando ser aprovado há 15 anos. Todo país precisa de uma lei dessas?
Kenneth Serbin - Essa legislação é muito necessária, com as consequências do genoma e das pesquisas que estão mudando o sistema de saúde. O fato de uma pessoa poder saber seu futuro por um teste genético exige mais proteção para o cidadão.
Infelizmente, a discriminação é forte entre empregadores, companhias de seguros, colegas de trabalho. A própria família discrimina o doente. Isso acontece com doenças neurológicas, que de certa forma mudam a personalidade da pessoa.
É necessária uma legislação que ajude as pessoas a ter uma vida tranquila, a criar um clima de entendimento sobre doenças genéticas. A gente tem de achar uma maneira de as pessoas não terem medo de fazer os testes.
O sr. levou 17 anos para sair do "armário genético". Por quê?
Eu só revelei isso agora para o meu plano de saúde, embora tivesse Huntington na família desde 1995. Tinha medo de perder o emprego, de ter de mudar de universidade e de plano de saúde, de ficar sem cobertura para Huntington. Todos esses anos eu me tratei do meu próprio bolso.
Sofreu alguma discriminação depois de revelar que era o autor do blog de Gene Veritas?
Foi primeiro uma reação de choque. Ninguém imaginava que eu e a minha família estivéssemos passando por isso. Três testes preditivos: primeiro minha mãe, em 1995, depois eu, em 1999, depois minha filha, em 2000.
É uma doença horrível, como se fosse uma combinação de alzheimer, parkinson e problemas psiquiátricos. Também problemas cognitivos, perda de memória de curto prazo, da fala, do raciocínio. Agressividade, depressão, alucinações. Algumas pessoas dizem que essa é a doença do diabo.
Os colegas não tinham noção, mas, até agora, encontrei bastante solidariedade.
Como o sr. compara a organização de quem milita pela causa no Brasil e nos EUA?
Há dificuldades em qualquer país. Nos EUA, a Sociedade Americana da Doença de Huntington existe há quase 50 anos. A Associação Brasil Huntington tem mais ou menos 15 anos e está fazendo um ótimo trabalho, quando você leva em conta a quase inexistência de recursos. A americana tem orçamento na casa de US$ 9 milhões, e a brasileira, R$ 40 mil.
Queria que minha ida ao congresso no Rio desse impulso ao movimento, que as pessoas doassem mais dinheiro para a associação.
O sr. é católico praticante. Caso o teste de sua filha indicasse a mutação, o que o casal faria a respeito?
A gente teria de conversar, refletir, rezar, falar com os médicos, amigos e parentes. Seria uma decisão difícil. Claro que havia a possibilidade de aborto, aqui [nos EUA] é legal, diferentemente do Brasil. Não sei o que a gente teria feito. Pensava na possibilidade de um aborto? Sim.
Por causa da instabilidade genética, um homem pode passar para o filho uma versão mais grave da doença. De minha mãe eu herdei a cópia exata da mutação. Eu poderia ter passado para a minha filha uma mutação mais severa, e ela poderia desenvolver a doença na juventude. Dez por cento dos casos de Huntington são juvenis, a maioria morre antes dos 30 anos.
Nem todo teste genético é tão preditivo quanto o de Huntington. O sr. é a favor de testar embriões mesmo no caso dessas outras doenças?
Para isso existe a bioética. Sou contra o que se faz na China, na Índia, abortar pelo sexo da criança. Eu não faria, mas não vou julgar quem faz. Aborto tem de ser uma opção, para não acontecer o desastre de saúde pública que há no Brasil, com tantas mulheres que morrem porque não podem fazer aborto no hospital.
Um teste preditivo dá as informações de que você precisa para fazer seu plano para enfrentar a vida. Preciso me cuidar, tenho uma filha de 13 anos. Se eu ficar doente, não sou um peso só para mim, mas para minha família.
A que o sr. atribui a ausência de sintomas? Sua mãe desenvolveu a doença aos 48 anos, e o sr. está com 53. Tem esperança de não desenvolvê-la?
Faço exercícios, não como besteira. Esperança? Por enquanto, não.
Mudar de especialidade aos 50 anos é uma reviravolta. O sr. acredita que essa ginástica mental pode ter a ver com a ausência de sintomas?
Não posso comprovar nada cientificamente, mas acho que sim. Estou fazendo a coisa certa, seguindo os conselhos dos médicos. Tomo suplementos: creatina, coenzima Q10, açúcar trealose, ômega 3, comprimidos de mirtilo. Claro que o plano de saúde não cobre. A burocracia médica é lenta para aceitar os novos remédios.
Quanta informação o sr. dá para sua filha?
Se ela faz uma pergunta, respondo. Quando ela tinha uns dois ou três anos, já sabia que a avó estava doente. Falei que ela tinha um machucadinho no cérebro. Ela perguntou: "Como a vovó conseguiu esse machucadinho?". Disse que tinha nascido com ele. Ela logo disse: "Ainda bem que não nasci com esse machucadinho". Agora, com 13 anos, ela entende muito bem. Quem esconde só cria problemas.

PALESTRAS
Rio de Janeiro - "Como Lidar com a Doença", Congresso Mundial de Huntington, Hotel Sheraton, seg. (16) às 14h

São Paulo - "A Doença de Huntington e a Bioética", Centro Universitário São Camilo, r. Raul Pompeia, 144, sáb. (21) às 10h (aberto ao público)



O autismo e seus personagens

Não é uma doença. E, definitivamente, 
o indivíduo dentro do espectro do autismo não pode, 
nem deve, ser tratado como doente

Marilize, Mariangela e Ana Paula acompanham de perto toda
a rotina das crianças
(Foto: Camila Tsubauchi/ Diário)
“Sou a Ana Paula, mãe das gêmeas Caroline e Gabriela que hoje têm seis anos. Quando elas tinham três, recebemos o diagnóstico de que elas estavam dentro do espectro autista”. “Sou o Cleverson e essa é a minha esposa Mariangela, somos os pais do Tiago de três anos, que também está dentro do espectro”. “Meu nome é Jacieli, sou mãe do Caio de sete anos e ele é autista”.
Frases como essas foram ditas inúmeras vezes na noite de uma segunda-feira. As alterações se limitavam ao nome e idade dos personagens, mas a conclusão era sempre a mesma: meu filho está dentro do espectro autista. Era uma reunião de pais que, juntos, pretendem formar uma associação guarapuavana que auxilie no tratamento de crianças, e até mesmo de adultos, com diagnóstico de autismo.
Os encontros acontecem a cada 15 dias e são coordenados pela psicóloga especialista no transtorno, Rosemeire Silva Pereira. Foi dela a ideia de juntar os quase 20 pais em torno da mesma mesa. O objetivo era compartilhar progressos, percalços e experiências do dia a dia das crianças. “A gente precisa de apoio psicológico também. Temos altos e baixos que não se pode acreditar”, contou Ana Paula dos Santos.
Rosemeire apresenta estudos, notícias e presta esclarecimentos sobre o transtorno. Também são exibidos vídeos e disponibilizados materiais que podem contribuir para o desenvolvimento das crianças. Mas em duas horas, todos têm direito a falar. “Esse grupo é justamente para nos dar um respaldo, para a gente ver que existem mais pessoas dentro da mesma situação”, justificou Ana Paula.
Para Marilize Zanatta, mãe de Matheus, 8, é o momento de compartilhar vitórias com quem as entenda como vitórias. Jacielide Campos concorda e exemplifica. “Para os nossos filhos, escovar os dentes e pentear o cabelo é uma dificuldade enorme”. Isso acontece porque a coordenação motora fina dos autistas é diferente da exibida por crianças neurotipicas. Na maioria das vezes, ela é limitada.
E é preciso ressaltar o termo “na maioria das vezes”, pois não é difícil encontrar pacientes dentro do espectro com excelente domínio dos movimentos. “O autismo não tem um padrão, cada um é diferente”, disse a psicóloga. Matheus é exemplo disso. Com muito treino, o menino aprendeu a tocar piano, mas por causa da agenda apertada, teve de interromper as aulas por alguns meses.
Na semana passada, Marilize voltou à escola de música com Matheus. “Ele se sentou na frente do piano e tocou como se nunca tivesse parado”, contou ela, entre lágrimas. As reações de orgulho e alegria são coletivas. Todos comemoram e apóiam o sucesso de suas próprias crianças e das crianças dos outros. “Os pais precisam estar bem para cuidar bem dos filhos”, desabafou Jacieli.
A associação
Há cerca de um mês, o ideal de fundar a associação de pais e profissionais começou a tomar forma. A proposta partiu de Cleverson Toledo, pai de Tiago, e foi aceita pela maioria. Ana Paula, que é advogada, buscou se inteirar sobre a legislação vigente e os trâmites para registrar a entidade. “Acredito que até o fim deste mês o estatuto esteja fechado e já estamos indo atrás de uma sede própria”.
As psicólogas do grupo também estão envolvidas na organização. Rosemeire trabalha em conjunto com Tamires Bareta para reunir informações sobre a quantidade de pacientes diagnosticados em Guarapuava, não diagnosticados ainda ou que recebem tratamento só uma vez por semana. Quando tudo isso estiver pronto, a associação pretende lutar pela implementação de políticas públicas em saúde.
“A rede pública não nos oferece nada. Temos duas clínicas especializadas, uma em São Paulo e outra em Curitiba, que dão suporte ao tratamento. Alguns pais pagam por essas clínicas e elas dão respaldo para profissionais da cidade que vistoriam nossos filhos”, explicou Ana Paula. “É uma equipe que nós mesmos montamos e é paga individualmente”, completou Rosemeire.
Outro ponto que deve ser trabalhado pela associação é o diagnóstico precoce do espectro autista. Estudos apontam que a idade ideal para início do tratamento é até os 3 anos de idade. Segundo Rosemeire, “em Guarapuava, existem crianças de 12 anos que os médicos ainda afirmam que não têm nada. Nessa idade, a gente já perdeu um tempão que podia ter sido usado para trabalhar as necessidades”.
Para fechar o laudo de diagnóstico, é necessária a opinião de pelo menos três profissionais distintos: um neuropediatra, um psicólogo e um fonoaudiólogo. Conforme Rosemeire, a constatação depende de uma avaliação comportamental porque não existe exame de laboratório que identifique o transtorno. “A gente vê muitos profissionais que não têm essa leitura e acaba passando batido. Quando adulto, o prognóstico é menor”.
Os encontros de pais e profissionais de saúde acontecem a cada 15 dias, sempre nas noites de segunda-feira. Informações adicionais podem ser obtidas com a psicóloga Tamires Bareta pelo telefone (42) 9984-9395.
• Entenda o autismo
Não é uma doença. E, definitivamente, o indivíduo dentro do espectro do autismo não pode, nem deve, ser tratado como doente. Isso é preconceito. Entre os pais, não faltam histórias de discriminação nos mais diversos meios: escola, trabalho, supermercado e até mesmo em órgãos públicos.
Esses episódios são fruto da falta de conhecimento sobre o transtorno – uma falta muito comum na sociedade em que vivemos. “Quando o médico me falou que o Caio tinha autismo, lembrei da única coisa que já tinha visto sobre, a propaganda que passava na televisão com a Mônica e o Cebolinha”, contou Jacieli.
A campanha foi desenvolvida pela Ama (Associação de Amigos do Autista) e destacava as reações da criança autista frente a atividades simples do dia a dia. Mas não faltam opções no cinema e na literatura que tratam do tema. Separamos algumas sugestões de filmes que têm personagens autistas em sua trama.
• Rain Man (1988)
Charlie (Tom Cruise), um jovem yuppie, fica sabendo que seu pai faleceu. Eles nunca se deram bem e não se viam há vários anos, mas ele vai ao enterro e ao cuidar do testamento descobre que herdou um Buick 1949 e algumas roseiras premiadas, enquanto um “beneficiário” tinha herdado três milhões de dólares. Curioso em saber quem herdou a fortuna, ele descobre que foi seu irmão Raymond (Dustin Hoffman), cuja existência ele desconhecia. Autista, Raymond é capaz de calcular problemas matemáticos com grande velocidade e precisão. Charlie sequestra o irmão da instituição onde ele está internado para levá-lo para Los Angeles e exigir metade do dinheiro, nem que para isto tenha que ir aos tribunais. É durante uma viagem cheia de pequenos imprevistos que os dois entenderão o significado de serem irmãos.
• Tão Forte e tão perto (2012)
Oskar Schell (Thomas Horn) é um garoto muito apegado ao pai, Thomas (Tom Hanks), que inventou que Nova York tinha um distrito hoje desaparecido para fazer com que o filho tivesse iniciativa e aprendesse a falar com todo tipo de pessoa. Thomas estava no World Trade Center no fatídico 11 de setembro de 2001, tendo falecido devido aos ataques terroristas.
A perda foi um baque para Oskar e sua mãe, Linda (Sandra Bullock). Um ano depois, Oskar teme perder a lembrança do pai. Um dia, ao vasculhar o guarda-roupa dele, quebra acidentalmente um pequeno vaso azul. Dentro há um envelope onde aparece escrito Black e, dentro dele, uma misteriosa chave. Convencido que ela é um enigma deixado pelo pai para que pudesse desvendar, Oskar inicia uma expedição pela cidade de Nova York, em busca de todos os habitantes que tenham o sobrenome Black.

FONTE:
Diário de Guarapuava
Camila Tsubauchi

Autismo: uma doença cercada por mitos e preconceitos


Psicólogas explicam a disfunção e falam do processo de inserção do autista no meio social
Atualmente abordado pela novela das nove, da Rede Globo, o autismo é uma doença há muito conhecida, mas pouco entendida e difundida entre a sociedade. Segundo a psicóloga e psicopedagoga da Amhpla Cooperativa Médica, Raquel Bueno, "hoje as pessoas estão melhor informadas sobre o autismo, mas o preconceito e o medo quando se trata de doença mental ainda é uma realidade. A pessoa com deficiência não pode andar nas ruas sem ser alvo de olhares e comentários, algumas vezes sofrendo até discriminação", lamenta a especialista.
No entanto, a principal arma no combate ao preconceito e para a melhoria na qualidade de vida de quem convive com a doença, é a informação. Também especialista no assunto e credenciada da Amhpla, a psicóloga Karina Liboni afirma que "fornecer informações precisas sobre o autismo e autistas e suas características através da mídia, folhetos, palestras e grupos de apoio são importantes para a quebra de tabus sobre o tema. É preciso aumentar a conscientização sobre a diversidade, as semelhanças e as diferenças entre os indivíduos”, frisa.
Para quem não conhece, o autismo é uma disfunção global do desenvolvimento, é uma alteração que afeta a capacidade de comunicação do indivíduo, de socialização e de comportamento. Quando diagnosticado com autismo, a família do portador da doença também deve se moldar e estudar sobre o assunto, a fim de proporcionar maior qualidade de vida àqueles que precisam de auxílio.
"Para os pais poderem fazer a inclusão do autista, seja na sociedade ou a nível escolar, é necessário conhecimento. Conhecimento dos direitos da pessoa com deficiência para poder exigir do Estado toda a estrutura necessária para o desenvolvimento e bem estar do autista; conhecimento de como educar e de como entender o universo em que essa pessoa vive, tudo para poder traduzir a nossa realidade para ele", afirma Raquel. E Karina completa dizendo também que os pais precisam ser presentes e pacientes: “É importante o incentivo para as habilidades como vestir, comer, beber, que ajudam a criar independência. No processo de socialização, por exemplo, a prática de comunicação ajuda a criança autista a fazer amigos e ser aceito por seus pares”.
Além disso, destaca Raquel, os graus de autismo são diferentes, assim como os tratamentos e as limitações: “A educação tem que ser especializada, levando em conta as habilidades e limitações de cada indivíduo, pois temos autistas com graus variados de comprometimento. Pais e educadores têm que estar preparados para poder ensinar”.
Neste sentido, uma educação diferenciada e livre de preconceitos contribui para o desenvolvimento psicológico, social e motor das crianças autistas. A inclusão social e o auxílio dos pais, portanto, são fundamentais no processo de inserção dos autistas no meio social.

Ilustração Blog/Facebook Vivências Autísticas

sexta-feira, 13 de setembro de 2013

O autismo vem se tornando um dos mais graves problemas de saúde pública no Brasil.

Hoje, estima-se que uma em cada cem crianças apresenta o transtorno. Há 15 anos, os dados indicavam um caso em cada 2.000 crianças. Ainda que os critérios de diagnóstico tenham mudado, os especialistas reconhecem que houve aumento do número absoluto de casos.
Políticas em saúde mental infantil são uma preocupação relativamente recente, mesmo com índices crescentes de transtornos em crianças e adolescentes. Neste ano, importantes conquistas foram obtidas em termos legais, e a perspectiva de que o tratamento oferecido pelo Estado contemple abordagens psicológicas distintas é cada vez maior, o que configura enorme progresso.
Alguns desses avanços resultaram também da iniciativa de psicanalistas que se mobilizaram para tornar o autismo pauta do dia e para impedir que o seu método deixasse de ser utilizado nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), sob o argumento da "falta de cientificidade".
Em São Paulo, o Movimento Psicanálise, Autismo e Saúde Pública (MPASP) é um dos mais importantes no comando dessa iniciativa, dirigindo-se aos profissionais e aos gestores públicos da saúde a fim de incentivar a pluralidade de abordagens científicas e a oferta de um tratamento interdisciplinar das pessoas com autismo e suas famílias.
Apesar disso, chama a atenção como as grandes mídias ignoram a psicanálise, que tem, sim, muito a contribuir em termos de diagnóstico e tratamento. Programas televisivos recentes não disponibilizaram à população um rol completo de informações sobre o tema, enfocando apenas uma das formas de compreender o transtorno.
A perspectiva psicanalítica é uma valiosa abordagem para uma gama enorme de transtornos psíquicos e com o autismo não é diferente. Seu instrumental clínico possui reconhecimento em diversos centros de cuidado e deve ser integrado em nossas políticas públicas de saúde.
Sobre os métodos de tratamento, o que mais se vê em reportagens sobre o tema é o comportamental, com abordagens em torno de "dar independência" à criança, ensinar tarefas simples e "controlar a agressividade". Raramente se fala sobre o tratamento ter como foco a criança e seu bem-estar, simples assim.
A ênfase na necessidade de a criança autista se enquadrar em um modelo de comportamento tido como normal prevalece, deixando de lado a busca pelos sentidos que os sintomas expressam e que ajudam a compreender o papel da doença não apenas para a criança, mas também para a sua família.
A psicanálise compreende que o autismo está ligado a uma dificuldade de a criança se relacionar com a outra pessoa como um outro. E daí surgem consequências como os rituais autísticos, cuja função é manter o seu isolamento e impedir as trocas sociais.
Um aspecto central é a importância do diagnóstico precoce. Quanto mais cedo o transtorno é identificado, melhores os resultados do tratamento, já que é possível evitar que modos desviantes de funcionamento se cristalizem.
Em relação ao tratamento, o método psicanalítico se ocupa da estrutura mental e é pensado para trazer a criança para o contato, reduzir seu isolamento. Ainda que ela pareça muitas vezes estranha e inacessível, o que se busca é encontrá-la onde ela estiver e trazê-la ao convívio.
A Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, que conta com dois grupos de estudos integrantes do MPASP, reconhece a complexidade do assunto, estimula o diálogo com outras abordagens e contribui na articulação de novas propostas para a saúde pública infantil.
Ignorar a psicanálise como método para detecção e tratamento do autismo é privar as famílias de um instrumental científico que pode, em muito, abreviar o caminho para um diagnóstico definitivo e proporcionar um tratamento de qualidade.
FONTE:
NILDE JACOB PARADA FRANCH, 77, é presidente da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo.

Autismo: cientistas conseguem restabelecer conexões entre neurônios


Imagem mostra no topo à esquerda um neurônio normal. À direita deste, está um neurônio de um camundongo com mutação no gene que produz a proteína NHE6. Na parte inferior, à esquerda, aparece novamente um neurônio normal e, à direita, um com defeito - mas ambos tendo recebido tratamento com BDNF (Morrow lab/Brown University/Divulgação)

Pesquisa com camundongos mostra caminho para possível tratamento

Cientistas identificaram uma causa genética para um déficit na ligação entre neurônios e os circuitos cerebrais em pessoas com certos tipos de autismo. Os pesquisadores afirmam ainda que conseguiram, em camundongos, restaurar o crescimento neuronal ao compensar o problema nos mecanismos moleculares que eles identificaram. O estudo foi divulgado nesta quinta-feira na revista especializada Neuron.
A mutação do gene que produz uma proteína chamada de NHE6 costuma ser diretamente associada a um tipo raro e severo de autismo chamado de síndrome de Christianson. Mas os pesquisadores afirmam ter descoberto uma ligação desse gene com outros tipos de autismo mais comuns.
"No autismo geral essa proteína é desregulada", diz Eric Morrow, professor da Universidade Brown, nos Estados Unidos. A NHE6 ajuda a regular a acidez do endossomo - organelas responsáveis por transportar o material ao redor das células e degradar proteínas, inclusive aquelas necessárias para que os neurônios cresçam seus longos braços (axônios e dendritos) para formar as conexões dentro do cérebro.
Os cientistas descobriram que camundongos com mutação nesse gene tinham uma acidez maior nos endossomos. Essa desregulação afetava moléculas presentes na célula que regulam o crescimento dos axônios e dendritos. Os animais com essa mutação acabavam por ter menos conexões entre neurônios, chamadas de sinapses.
"Um dos problemas primordiais em desordens como o autismo, nós acreditamos, é que elas são um problema de comunicação entre diferentes áreas do cérebro e de neurônios que se comunicam com outros em rede", diz Morrow.
Para tratar o problema, os cientistas testaram aplicar diretamente uma das moléculas em falta nos camundongos (chamada de fator neurotrófico derivado do cérebro, ou BDNF, na sigla em inglês). Os animais que receberam o BDNF tiveram um crescimento dos axônios e dendritos próximo ao de um neurônio normal. Outro dado destacado é que já existem remédios para reposição do BDNF disponíveis para os pacientes.
"Nós não achamos que isto seja tudo sobre esta condição", diz Morrow, que agora tenta entender melhor as respostas dadas ao uso dos medicamentos. "Mas se somos capazes de tratar este mecanismo com drogas exógenas, isso poderia reparar o suficiente ou ao menos algum elemento (do autismo)?", questiona
FONTE: 

ISTOÉ ONLINE

http://www.istoe.com.br/reportagens/324041_AUTISMO+CIENTISTAS+CONSEGUEM+RESTABELECER+CONEXOES+ENTRE+NEURONIOS?pathImagens=&path=&actualArea=internalPage

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Governo do Paraná autoriza licitações para obras em APAES


O governador Beto Richa autorizou licitações para obras de reparos, melhorias e ampliações em 13 Apaes (Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais) do Paraná. O valor total das obras é de R$ 2,1 milhões. As licitações estão previstas para acontecer ainda neste mês de setembro e o início das obras deve ocorrer ainda em 2013.

“As Apaes e demais escolas especiais têm agora os mesmos direitos e benefícios das escolas da rede regular de educação. Isso quer dizer que vão receber obras e infraestrutura para melhorar as condições de atendimento aos alunos”, destacou o governador Beto Richa.

No final do mês de agosto, Richa sancionou a lei do programa Todos Iguais Pela Educação, que concede às escolas básicas de Educação Especial, mantidas pelas Apaes e outras instituições sociais, os mesmos direitos e recursos destinados às escolas públicas da rede estadual. A iniciativa é pioneira no país e transforma o auxílio em apoio permanente.

Com a lei, 413 escolas e instituições que hoje atendem 42.618 alunos de várias idades com deficiência vão receber dotação orçamentária do Estado para melhorias e adequações nas instalações físicas e pedagógicas. “É fundamental que todos, diferentes nas suas necessidades, sejam iguais no direito à educação de qualidade para desenvolver plenamente o seu potencial”, afirmou o governador.

Serão destinados R$ 436 milhões às escolas de educação especial. Os recursos servem para investimentos em pessoal, equipamentos, reformas, merenda escolar, além de ônibus para o transporte. As obras nas 13 Apaes fazem parte do programa Todos Iguais Pela Educação.

NA PRÁTICA - As unidades beneficiadas são a Escola Raio de Luz, em Andirá (Norte Pioneiro), Escola Viva Vida, em Enéas Marques (Sudoeste), Apae de Formosa do Oeste (Oeste), Escola Criança Esperança, em Indianópolis (Noroeste), Escola Nélci Felini, em Laranjeiras do Sul (região Central), Escola Marilandense, em Marilândia do Sul (Norte), Escola União, em Mariópolis (Sudoeste), Escola Luz da Manhã, em Paulo Frontim (Sul), Escola Nilda Maria Tessaro, em Pérola do Oeste (Sudoeste), Escola Doutor Osvaldo Braga, em Rio Bom (Norte), Escola Caviúna, em Rolândia (Norte), Escola Mundo da Criança, em Santa Izabel do Oeste (Sudoeste) e Escola Holanda Colladel, em Verê (Sudoeste).

terça-feira, 10 de setembro de 2013

ESTATUTO DO DEFICIENTE


Tantas vezes modelos para criação de um Estatuto do Deficiente em nosso país entraram em discussão que já se perderam no tempo. Alguns por falta de objetividade, outros pela falta de debate com os que efetivamente necessitam dele ou com grupos representativos que possam diretamente contribuir para minimizar sofrimentos ou garantir, amparo para os desvalidos da mente ou físicos.
Nos estertores de 2007 quase chegamos aos finalmente, mas por incrível que pareça, por ser final de mandatos e legislatura, a vaidade de alguns deputados federais e senadores, fizeram com que o projeto do estatuto fosse colocado nas gavetas da Câmara, para dormir e nunca mais acordar.
Menos mal, pois o Senado Federal, na época como casa iniciadora do projeto, mandou o modelo devidamente aprovado para a Câmara dos Deputados, porém, seriam tantas as correções necessárias, além de uma considerável quantidade de emendas que deveria receber, que o ordenamento jurídico do mesmo, tanto pátrio como internacional ficaria comprometido, devendo ser obrigatoriamente revisto, o que até onde sabemos, nunca aconteceu.
Um dos fatores que mais prejudicou a criação da lei na época, foi a “briga pela paternidade” do estatuto entre alguns deputados e senadores, não excluindo pais de autistas que apreciam inventar sobre o inventado.
O atual texto do Estatuto do Deficiente que foi feito a partir dos projetos preexistentes no Congresso, está em análise e em fase final de elaboração, com sua conclusão prevista para o MÊS DE OUTUBRO, tem muita coisa boa nas suas cláusulas e parágrafos. Uma delas é que a Discriminação e o Preconceito passam a ser crime.  Casamento entre deficientes intelectuais também está previsto. Direito à habitação, e também a inclusiva. Habilitação e Reabilitação. Educação inclusiva.
Todo direito a saúde será garantido pelo SUS, e muito mais coisas que não entendo, até porque para mim precisam da luz do Direito, entre outras a Curatela e demais itens que não alcança minha formação acadêmica. Então, aquilo que não deciframos quem explica?
O que me preocupa é que Quando estiver promulgado, o Estatuto da Pessoa com Deficiência, como está, ou alterado na sua atual redação, será uma lei como outra qualquer.
Sem a atuação das “pessoas com deficiência” onde se inserem os autistas e seus pais na sua defesa, suas respostas só virão da política, e esta nós estamos cansados de saber que só será pública, se tivermos atuação firme e decisiva agora.
A relatora do projeto é a deputada federal Mara Gabrilli que em suas falas deixa claro que alterações “ainda” podem ser feitas, desde que plenamente justificadas uma vez que a redação atual passou por pessoas e instituições especializadas.
Cadastre-se no site: edemocracia.camara.gov.br  de onde o modelo do estatuto poderá ser baixado para exame e discussão, enquanto ainda é tempo.
Não esqueça que eles falam que o prazo para discussão e resultados de reuniões públicas para serem examinados é até Outubro. Quem me diz que - até outubro - não seja SETEMBRO.
Quantos de vocês que estão me lendo sabiam que o Estatuto do Deficiente está acontecendo e se encontra em fase final.
Faça sua parte... Antes que seja tarde.
Respeitosamente
Nilton Salvador


segunda-feira, 9 de setembro de 2013

A mãe – o autismo do outro lado da porta

     
Boa tarde, Márcia! Oi João Pedro, vamos lá? Hoje a tia vai fazer uma brincadeira super legal!”
A porta é fechada. A sessão do Pedro com a T.O. começa.
 Márcia é a mãe do autista na recepção da clínica, Pedro é a criança autista dentro da sala.
Dentro do consultório a terapeuta trabalha com o Pedro. Os jogos, os desafios, muita coisa a aprender. Esse é o autismo lá dentro.
Do outro lado da porta a Márcia abre a revista Caras e passa as páginas sem ler um parágrafo sequer.  Seu pensamento está dentro da sala. Seu pensamento está no futuro incerto do Pedro. Esse é o autismo do outro lado da porta. Esse é o autismo sem atendimento.
Quantas vezes ali do outro lado da porta a Márcia chorou? Quantas vezes ela pensou: como vou pagar a terapia deste mês? Será que meus outros filhos já fizeram o dever de casa hoje? Será que o Pedro algum dia fará um dever de casa? Será que o Pedro vai dormir hoje à noite? Se ele dormisse… seria bom ter esse tempo com meu marido.
Mas o dia seguinte vem e as forças da Márcia se renovam no sorriso do Pedro. Essa é a sua terapia… Vê-lo sorrir!
Márcia precisa ser forte, ela sabe. A sociedade não perdoa as birras do Pedro. O marido não perdoa a bagunça da casa. A vizinha de baixo não perdoa o barulho das passadas firmes do Pedro no meio da madrugada. A sogra não perdoa porque os “genes defeituosos” não vieram da família dela.  A amiga de infância da Márcia não perdoa porque a Márcia precisa sempre desligar o telefone quando a conversa está ficando boa. MÁRCIA, A IMPERDOÁVEL!
Tem Márcia que chora, tem Márcia que ri pra não chorar.
Tem Márcia que ama o Pedro, tem Márcia que ama a Gabriela, tem Márcia que ama o Lucas, tem Márcia que ama a Stella.
Tem Márcia pra tudo. Tem Márcia pra dieta, tem Márcia pra Sonrise. Tem Márcia no workshop da ABA, tem Márcia no protesto da Esplanada.
Tem Márcia que tem um Pedro, mas não foi ela quem o pariu. Tem Márcia que ninguém sabe, ninguém viu!
Tem Márcia com o filho encarcerado, tem Márcia com o filho incluído. Tem Márcia que o filho está num ambiente escolar fingido. Finge que aceita, finge que inclui, finge que aplica. E a Márcia não suporta mais fingir que acredita.
Tem Pedro de tudo quanto é jeito, Pedro grave, Pedro leve. Pedro que dança, Pedro que representa. Tem Pedro que poderia aprender, mas ele não senta.
Márcia que largou a carreira profissional. Márcia que trabalha com a cabeça lá no Pedro!
Tem mil realidades da Márcia. Tem mil realidades do Pedro.
Márcia é você, Márcia sou eu.
Que precisa da manicure e da massagem que te cure. Que precisa desabafar e se cuidar. Márcias que precisam de condições pra trabalhar.
Márcia é missão que não acaba. Márcia trava a batalha diária e a vence todos os dias, pois todo dia é dia de vencer. Pedro é a criança diferente.
Pedro é muito além da gente. Pedro é muita areia pro caminhãozinho dessa sociedade. Pedro é arretado, Pedro é barbaridade!
Pedro não precisa de pena. Pedro precisa da ciência a seu favor. Pedro não precisa ser contido e sim que encontrem a origem de sua dor.
Levanta a cabeça Márcia, mesmo que ninguém venha a te cuidar. Acorda Márcia… acorda que a irmandade é azul e tem quem queira te abraçar.
O autismo do lado de cá da porta é bem difícil de levar. Mas você não pode parar, na fé, na força e no sorriso do teu Pedro…
Sorria Márcia, sorria!
(Essa é uma história “fictícia”, qualquer semelhança entre nomes e fatos terá sido mera coincidência!)
FONTE:

Estatuto amplia cotas e casamento de deficientes

          Um estatuto voltado a mais um grupo social, desta vez para as pessoas com deficiência, está em fase final de elaboração no Congresso e deve provocar polêmica em vários setores caso todos os pontos previstos sejam mantidos.
O documento prevê alterações tanto no Código Civil, dando direito a deficientes intelectuais a se casarem sem ter autorização dos pais ou da Justiça, quanto na Lei de Cotas, com a inclusão de pequenas e médias empresas na obrigação de empregar pelo menos um deficiente.
Todas as medidas previstas ainda podem ser alteradas, segundo a relatora do documento, a deputada federal Mara Gabrilli (PSDB-SP), mas a ideia é que os trabalhos se encerrem em outubro.
O estatuto terá implicações legais também nas áreas de saúde, educação, comércio e direitos humanos.
O documento determina, por exemplo, que escolas particulares não podem cobrar valores complementares para atender alunos com deficiência e tipifica o crime de preconceito e discriminação contra o grupo.
"O estatuto vai viabilizar uma série de direitos descritos na Convenção Internacional da Pessoa com Deficiência, da qual o Brasil é signatário, mas que ainda não são aplicados", afirma Gabrilli.
Juristas, congressistas e entidades civis participaram da elaboração do estatuto, que tem 134 artigos.
No capítulo relativo ao direito à cultura, esporte, turismo e lazer, o texto determina que as vagas reservadas a cadeirantes e pessoas com mobilidade reduzida, inclusive aos obesos, em salas de espetáculos, cinemas, ginásios, teatros, auditórios e outros não poderão ficar em apenas um setor específico.
O estatuto define a quantidade de vagas de acordo com o tamanho do estabelecimento e manda que os locais estejam espalhados por setores e não mais em nichos.
TRABALHO
Ponto que deve causar controvérsias no estatuto é o que altera a Lei de Cotas, que reserva vagas O documento passa a obrigar negócios de 50 a 100 funcionários a ter em seus quadros pelo menos uma pessoa com deficiência.
Atualmente, apenas empresas que tenham mais de 200 funcionários precisam cumprir a legislação, em percentuais de 2% a 5% dos postos de trabalho, dependendo do total de vagas.
Ercílio Santinoni, presidente da Conampe (Confederação Nacional das Micro e Pequenas Empresas), avalia que "não haverá problemas".
"As micro e pequenas empresas já têm uma preocupação grande com responsabilidade social. Não haverá resistência. O problema poderá ser a falta de mão de obra para assumir as vagas. É preciso criar mecanismos de justificativa para evitar multas àqueles negócios que não conseguirem cumprir a lei."
Uma pesquisa com 121 empresas analisadas pela consultora Talento Incluir indica que 87% delas não estão cumprindo a lei.
As alegações para tal foram a baixa qualificação dos profissionais, a dificuldade de encontrá-los, a falta de acessibilidade na empresa e o despreparo de gestores.

FONTE:
JAIRO MARQUES

quinta-feira, 5 de setembro de 2013

Maternidade "especial" - o que o feminismo tem a ver com isso?

Por: 
CYNTHIA BELTRÃO

      Maternidade “especial” é um assunto delicado. É um tema extremamente dolorido e que envolve um luto, real ou simbólico, pela criança e pela maternidade que imaginávamos pra nós. Mas eu acho que mesmo nessa situação tão complicada cabe a reflexão. Reflexão, não crítica, vejam bem. Meu objetivo aqui não é trazer mais culpas para nós mães, ainda mais para as “especiais”.
     Nós mães “especiais” somos cobradas a ter uma postura, um jeito de viver nossa maternidade, que aguça ainda mais a culpa já vivida por todas as mães (toda mãe carrega uma culpa, acredite, é só cutucar que ela aparece). E eu coloco mães “especiais” assim entre aspas porque, mesmo sendo eu mesma uma mãe “especial”, eu tenho muitos problemas com esse termo. Mas eu chego lá. Primeiro um pouquinho de contexto.
     Minha gravidez foi super tranquila. Max foi uma criança planejada e desejada. Fiz todos os exames, me alimentei bem, caminhei e ganhei só o peso esperado. Até que no exame do último mês veio o susto. O médico parou, olhou e olhou. Olhou o coração. O coração do meu filho que até então era perfeito, “normal”. “Estou vendo um probleminha aqui, vocês têm certeza que ninguém falou nada disso nos outros exames?”. Não, ninguém tinha falado nada. O médico que deveria ter percebido isso, lá no ultrassom morfológico, se preocupou mais em perguntar para que time o papai torcia (pra nenhum, ele detesta futebol) do que olhar com atenção para o coração do meu filho. Ficamos sabendo ali, na reta final, que Max era portador de uma cardiopatia complexa, a transposição de grandes artérias, e que teria que ser internado logo ao nascer.
Walk this way together. Foto de Felix M no Flickr em CC,
 alguns direitos reservados.
Pelos meses seguintes eu ia voltar em pensamento para o momento desse exame inúmeras vezes, como se tentasse corrigir ou recuperar alguma coisa. Não podia ser verdade, estava tudo indo tão bem, por que logo com a gente, por que logo comigo? A sensação era a de acordar de um sonho bom e sentir ele se esvaindo devagar, dando lugar a uma realidade dura demais. Eu tentava voltar pra dentro do sonho, mas não tinha mais jeito.
Max nasceu de cesariana, a termo. Não aguentaria o parto normal, para o qual eu tanto tinha me preparado.      Primeiro luto. Foi direto para a UTI, mal pude segurá-lo antes disso. Segundo luto. Não conseguiu mamar no peito, passei a tirar leite com bomba elétrica, não sem antes passar um aperto terrível por falta de orientação. Terceiro luto. Depois disso parei de contar.
     Resumindo muito, Max passou por quatro cirurgias complexas, dez meses de internação em UTI, traqueostomia por oito meses (um deles em casa), alimentação por sonda, homecare. E depois de tudo isso, quando a cardiopatia tinha sido vencida, depois que ele já estava recuperado, inclusive matriculado em escola regular, veio outro susto.
      Aos dois anos e meio Max foi diagnosticado com autismo. O que parecia ser um simples atraso devido ao longo período de internação tinha contornos muito mais sérios. Ele não ficava com as outras crianças, interagia pouco, não falava, sentado girava sobre o próprio eixo, brincava só com a roda dos carrinhos, olhava pouco nos nossos olhos. Os sintomas eram de autismo clássico. Definitivamente não dava mesmo pra voltar pra dentro do sonho.
     Orientados pelo psiquiatra e depois de várias pesquisas, iniciamos as intervenções necessárias. Muita sala de espera depois, Max é hoje uma criança falante, esperta, curiosa e definitivamente autista. É uma criança com necessidades especiais. Mas isso não faz de mim uma mãe “especial”, não mesmo. Eu não gosto desse termo, já falei pra vocês? Vou explicar o porquê.
     Ainda na época da UTI e da cardiopatia eu rapidamente percebi que a culpa seria nossa companheira de jornada. Eu e meu marido observamos certa vez que logo que o bebê do leito ao lado melhorava, nós pensávamos “ah, que pena que não foi com o nosso”. Mas quando outro bebê piorava, dizíamos “ainda bem que não foi com o nosso!”. E isso gerava uma culpa danada. Percebendo que se tratava de uma reação normal para o ambiente, cunhamos a expressão “Síndrome do Bebê do Lado” para lidar melhor com a situação. E combinamos que íamos enfrentar a culpa e não deixar que ela nos consumisse. Foi aí que eu comecei a notar que com relação às mães os mecanismos geradores de culpa eram ainda mais cruéis. E que a ideia de haver algo de especial na maternidade era na verdade uma armadilha.
     Antes de mais nada, não existe nada de especial mesmo em ser mãe. Isso pode soar maldoso ou insensível, mas é verdade. Num país onde não temos direito nem acesso pleno a planejamento familiar, incluindo aí a legalização do aborto, maternidade não é uma opção. Pode ser algo extremamente especial num nível individual, fantástico, maravilhoso, espiritual mesmo. Mas se é assim para uma, pode não ser para todas. Pra muitas mulheres é uma imposição. E se não existe opção, não existe escolha plena. Sem escolha, nada resta de especial.
     A maternidade “especial” também não é nada especial. Muitas crianças nascem com necessidades especiais, outras se tornam. Basta uma meningite, uma rubéola, um motorista bêbado… e pronto. Então pode acontecer com qualquer uma, pode acontecer com todas, e a qualquer momento da vida. Mesmo assim existe um discurso que ronda essas mães e que impõe a elas o rótulo de “especiais”, como se elas fossem únicas. Aparentemente esse discurso faz um elogio dessa maternidade, mas na verdade é aprisionador, culpabilizante e extremamente machista.
     Vejam bem, é muito comum elogiarem a mãe especial da seguinte forma: “Deus escolheu VOCÊ pra mandar essa criança, seu filho é especial porque VOCÊ é especial”. Essa frase é muito comum, mas existem variações não religiosas. Todas elas têm implicações cruéis para as mães. Nós mulheres já somos praticamente treinadas para ver a maternidade como bênção e destino, imaginem quando se escuta isso.
      A primeira consequência é a entrega total. A mulher deixa de cuidar de si, da relação com o companheiro, dos outros filhos, se os tiver. A maioria dessas mulheres é heterossexual e encontra-se em um relacionamento estável com um homem. A maioria desses homens vai embora. A sociedade desculpa esses homens, mas não essas mulheres. Elas são “especiais”. Deus as escolheu especialmente para esse papel.       Elas não podem ir embora.
     Além disso uma mãe especial deve ser feita de um material mais resistente. Dela é cobrada uma resiliência maior, afinal ela foi escolhida. Muitas escondem o cansaço, a angústia, o desespero por detrás dessa imagem. Elas consideram que têm que aguentar mais, dar conta de mais. Afinal, elas não seriam mães “especiais” se não fossem capazes de suportar mais que todas as outras. Por isso procuram menos ajuda profissional, estão mais sujeitas à depressão e a outros sofrimentos mentais, e consequentemente, à perda de emprego e à dissolução dos vínculos afetivos e familiares. É muito comum essa mulher se isolar na sua dor.        E a solidão, a depressão, o cansaço e a falta de perspectivas acabam sendo vistas como parte daquilo que é ser mãe “especial”. Tentar procurar ajuda é visto por ela e pela sociedade como sinal de fraqueza, afinal ela deveria aguentar. Ninguém cuida do cuidador.
     Para o Estado a mãe “especial” também é perfeita. Ela geralmente tem duas opções. Ou vai aceitar seu papel sem cobrar do governo a ajuda devida ou vai se organizar em associações que em sua maioria também substituem a ação estatal, como é o caso de algumas APAES. O Estado fica na cômoda situação de enviar verbas enquanto as famílias se desdobram para ocupar o vácuo deixado no tratamento dos seus filhos. Pretendo abordar essa questão, que é bastante complexa, em outro momento.
     É bom lembrar que essa idealização da maternidade é perniciosa também para a própria criança portadora de necessidades especiais. A mãe, tomada pela ideia de que precisa fazer todos os sacrifícios em nome do seu filho, vira presa fácil de tratamentos mirabolantes. A maior parte é indicada por gente que tem genuína vontade de ajudar mas pouco bom senso. Mas existem os aproveitadores que vendem tratamentos “alternativos” extremamente duvidosos. A mãe “especial” é muito vulnerável a esse tipo de assédio. Ela precisa tentar de tudo, TUDO MESMO, pra ajudar seu filho. E dá-lhe culpa. Muitos desses tratamentos são só inócuos, outros atrasam o emprego de métodos comprovadamente eficazes, alguns são só perigosos mesmo. E lá fica a mãe “especial”, perdida entre tantas escolhas e julgada por todos.
     Mas existe uma situação em que esse discurso da maternidade “especial” é ainda mais trágica. Trata-se da exploração por setores extremistas e patriarcais da nossa sociedade da culpa materna em caso aborto de fetos inviáveis, como os anencéfalos. Muitas mães “especiais” abdicam da própria vida em nome desse ideal de maternidade. É uma escolha dessas mulheres, claro. Mas não dá pra deixar de pensar que é uma escolha permeada de cobranças sociais, religiosas e machistas. Cobranças que jogam com a culpa dessas mulheres, tudo coberto pela embalagem da maternidade “especial”. É a imagem definitiva da “mãe acima de tudo”.
     Enfim, essa coisa de mãe “especial” é complicada demais. Até mesmo danosa. E o que o feminismo tem com isso? Bem, o feminismo tem como um de seus objetivos questionar os estereótipos ligados ao gênero, discutindo o que é ser mulher, o que é ser mãe e, por que não, o que é ser mãe “especial”. Muito pouco desse papel me parece ser “natural”. Na verdade, creio que a maior parte das implicações da maternidade “especial” é socialmente construída e mantida por forças patriarcais que se beneficiam dessa abnegação feminina.
     Da mulher que vai permanecer junto à criança doente quando abandonada por um companheiro insensível e egoísta, mantendo a ideia de unidade familiar a todo custo, passando pela mulher que abdica do trabalho e da saúde física e mental para dar sozinha assistência ao filho, até a mulher que sacrifica a vida mesmo sabendo que o feto não sobreviverá a ela, todas são versões de um ideal de maternidade que pouco beneficia a mulher. Restam como testemunhas abnegadas do descaso de seus companheiros e de um Estado que lucra com seu estoicismo. Penso que tanto essas mulheres quanto seus filhos ganhariam mais se esse ideal fosse questionado. A mãe “especial” não é super. Ela sou eu, pode ser você, pode ser sua irmã, esposa, companheira, filha, vizinha. Vai precisar da sua ajuda, vai precisar de amparo, colo, ombro amigo e uma ajudinha pra olhar a criança pra que ela descanse um pouco. Mas ela não precisa, com certeza, é de mais culpa.
FONTE:

Plano é condenado a indenizar pais de criança por falta de cobertura em tratamento de autismo

         Por não oferecer cobertura e reembolso total dos custos referentes ao tratamento médico de uma criança de três anos com autismo, o plano SulAmerica Seguro Saúde S/A foi condenado a pagar aos pais da criança R$ 63.377,04, sendo R$ 43.377,04 por danos materiais e R$ 20 mil por danos morais. A decisão do juiz Rogério Lins e Silva, da 2ª Vara Cível do Recife, foi publicada no Diário de Justiça Eletrônico dessa terça-feira (3). O plano de saúde ainda pode recorrer da decisão.

A decisão também determina que a Sul América autorize a realização de todos os procedimentos necessários ao tratamento da criança com autismo. 

Na sentença, o juiz declarou que a cláusula do contrato do plano que limita o valor de cobertura de tratamento de saúde é abusiva. Por esse motivo, foi determinada na sentença a restituição de R$ 43.377,04, valor gasto pelo casal e que não foi reembolsado pela seguradora, sob a alegação de cláusulas contratuais que só permitiam a restituição parcial.

DANOS MORAIS – Com base na jurisprudência de outros tribunais, o magistrado condenou a seguradora por danos morais. "Com base no artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, condeno a seguradora demandada a pagar uma indenização ao autor por lhe ocasionar danos morais, consistentes em negar o reembolso de despesas que lhe eram devidas, causando-lhe abalos psíquicos, problemas financeiros e angústia", escreveu o magistrado.


FONTE:

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

STF manda Gol reservar 2 assentos por voo para deficientes de baixa renda


A companhia aérea Gol deve reservar, no mínimo, dois assentos em todos os seus voos nacionais para deficientes de baixa renda. A decisão, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), foi mantida pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa.
Em nota, a Gol afirmou que "cumpre a determinação judicial". Têm direito ao benefício pessoas com deficiência física, mental, auditiva, visual ou renal crônica, e com renda familiar mensal per capita de até um salário mínimo. É preciso fazer um cadastro no Ministério dos Transportes.
Tudo começou quando o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil pública contra a União Federal e a Gol para assegurar aos deficientes comprovadamente carentes o direito ao passe livre e gratuito, em todos os voos realizados pela companhia dentro do território nacional.
Em seu recurso ao STF, a empresa pediu para a decisão ser suspensa.
Os motivos alegados foram: 1) que a União excluiu o transporte aéreo dos benefícios da lei que concede passe livre às pessoas portadoras de deficiência no sistema de transporte coletivo interestadual (Lei 8.899/1994); 2) que é inconstitucional a criação de benefício de seguridade social sem prévia fonte de custeio (artigo 195, parágrafo 7º, da Constituição Federal ); 3) que, se for compelida a respeitar o benefício, a empresa vai transferir para os demais consumidores o respectivo ônus financeiro; 4) que o benefício frustra a expectativa da empresa quanto à lucratividade dessa modalidade de transporte; 5) que a medida provocará desequilíbrio artificial das condições de concorrência, pois apenas ela estaria sujeita à decisão.
O pedido de suspensão da decisão foi encaminhado anteriormente ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu não ter competência para julgar o caso e encaminhou-o à Suprema Corte.
O presidente do STF negou o pedido, e afirmou que cabia a empresa "ir além de ilações ou de conjecturas, com o objetivo de demonstrar que os efeitos da decisão impugnada superam a simples redução da perspectiva dos resultados financeiros da pessoa jurídica".

Também segundo ele, "o hipotético transporte gratuito de até dois passageiros a cada voo não tem intensidade suficiente para retirar completamente o interesse na exploração econômica dos serviços de transporte aéreo de passageiros".

FONTE:

VIVÊNCIAS AUTÍSTICAS

VIVÊNCIAS AUTÍSTICAS

Gênio da bola, Messi foi diagnosticado com autismo quando criança, revela escritor

Segundo Roberto Amado, craque do Barcelona sofre da 
 síndrome de Asperger

Gênio da bola, Messi foi diagnosticado com autismo quando criança, revela escritor

Segundo Roberto Amado, craque do Barcelona sofre da 
 síndrome de Asperger
David Ramos / Getty Images
Gênio inquestionável do futebol, para muitos já no patamar de Diego Armando Maradona e Pelé, o argentino Lionel Messi, dono das últimas quatro Bolas de Ouro da Fifa, pode sofrer de uma forma leve de autismo, a síndrome de Asperger.
A revelação bombástica foi feita pelo escritor Roberto Amado, sobrinho de Jorge Amado e autor do livro Poucas Palavras, em um artigo publicado na internet.
Segundo Amado, o autismo de Messi ajudou o argentino a se tornar o gênio que é e foi diagnosticado quando o craque ainda era criança, aos oito anos de idade.
Em seu artigo publicado na internet e que está causando rebuliço nas redes sociais, o escritor explica sua tese baseado na observação ao comportamento de Messi e também nos depoimentos de pais de crianças altistas.
— Ter síndrome de Asperger não é nenhum demérito. São pessoas, em geral do sexo masculino, que apresentam dificuldades de socialização, atos motores repetitivos e interesses muito estranhos. Popularmente, a síndrome é conhecida como uma fábrica de gênios. É o caso de Messi. É possível identificar, pela experiência, como o autismo revela-se no seu comportamento em campo, nas jogadas, nos dribles, na movimentação, no chute.
Um dos depoimentos que integra o artigo é dado por Nilton Vitulli, pai de um portador da síndrome de Asperger e membro atuante da ONG Autismo e Realidade e da rede social Cidadão Saúde, que reúne pais e familiares de aspergianos.
Segundo Vitulli, é possível encontrar sinais da condição de Messi até nos momentos em que o argentino comemora seus gols.
— O Messi sempre faz os mesmos movimentos: quase sempre cai pela direita, dribla da mesma forma e frequentemente faz aquele gol de cavadinha, típico dele. É como se ele previsse os movimentos do goleiro. Ele apenas repete um padrão conhecido. Quando ele entra na área, já sabe que vai fazer o gol. E comemora, com aquela sorriso típico de autista, de quem cumpriu sua missão e está aliviado.
A dificuldade de Messi para lidar com a imprensa em grandes eventos ou simples entrevistas foi apontada por Giselle Zambiazzi, presidente da AMA Brusque, (Associação de Pais, Amigos e Profissionais dos Autistas de Brusque e Região, em Santa Catarina), e mãe de um menino de dez anos diagnosticado com síndrome de Asperger, como outro ponto a ser observado.

— É visível o quanto aquele ambiente o incomoda. Aquele ar perdido, louco pra fugir dali. A coçadinha na cabeça, as mãos, o olhar que nunca olha de fato. Um autista tem dificuldade em lidar com esse bombardeio de informações do mundo externo.
FONTE: